quarta-feira, 10 de julho de 2013

Mohamed Morsi não é mais o presidente do Egito

Comemoração na Praça Tahrir.

Nesta quarta-feita (3) Mohamed Morsi foi oficialmente deposto. Os intensos protestos organizados pelos opositores resultaram em uma intervenção militar que tirou o (ex?) membro da Irmandade Muçulmana da chefia do poder executivo.

No passado dia 30 de junho Mohamed Morsi completou seu primeiro ano na presidência. Para que esta data realmente fosse marcante seus adversários organizaram intensos protestos que tinham apenas um fim: derrubar o presidente. Liderados pelo grupo Tamarod (rebelião), eles se mobilizaram no país todo e prometeram não descansar até que Morsi abandonasse o cargo.

A Irmandade Muçulmana, por sua vez, fez com que seus militantes se preparassem para defender a legitimidade do presidente. Desde sexta-feira eles acamparam em frente ao palácio presidencial esperando pelos opositores.

O exército disse que só iria interferir caso a situação se tornasse ainda mais caótica. E foi exatamente o que aconteceu. Na segunda-feira (1), através de um comunicado oficial, deram 48 horas para o presidente Mohamed Morsi apresentar uma resposta satisfatória ao povo. O engenheiro disse que seu poder estava em consonância com as forças armadas e que não toleraria qualquer golpe. Esta foi claramente uma resposta aos militares, e não aos manifestantes.

Nas ruas, pouco a pouco, os confrontos entre os pró e os anti-Morsi iam se intensificando. A sede da Irmandade Muçulmana em Alexandria foi atacada após um dos membros atirar contra os manifestantes. O Egito esteve (e para falar a verdade ainda está) à beira de uma guerra civil. Os relatos de violência (incluindo  46 agressões sexuais) e os 16 mortos deixam isso muito claro.

Mas como as coisas chegaram a este extremo?

Para entender as circunstâncias que levaram à queda de Morsi, devemos fazer uma retrospectiva até o cenário político egípcio logo que o ditador Hosni Mubarak foi deposto. Na época os militares também tiveram um papel vital, se encarregando das eleições parlamentares e da organização das presidenciais.

Como expliquei em minha análise da Primavera Árabe realizada no ano passado, a ascensão da Irmandade Muçulmana (da qual falei aqui e aqui) era mais do que lógica. Afinal de contas, não havia qualquer outro grupo organizado. No entanto, o fato de Ahmed Shafiq, ex-ministro das relações exteriores de Mubarak, ter ficado na segunda colocação revelou o receio que parte dos seculares sentiam da Irmandade e seu candidato.

A maioria dos observadores externos não sabia o que pensar da entidade. Para eles o fato de Morsi ter se afastado dela oficialmente (o que não corresponde à realidade) e algumas divergências iniciais com personalidades políticas muçulmanas mostravam que ele seria um presidente "moderado". A grande ajuda do governo Obama desde o início do mandato também moldou o pensamento das demais nações ocidentais.

Mediar o cessar-fogo entre Israel e o Hamas só abrilhantou a imagem de Morsi. Mas a "lua-de-mel" com o Ocidente durou pouco. A coisa começou a mudar de figura quando ele anunciou um decreto faraônico no qual submetia todas as decisões a seu poder sem revisão judicial até que uma nova Constituição fosse elaborada. Apesar do autoritarismo, não houve pressão externa e os protestos dentro do país foram facilmente controlados.

O autoritarismo da Irmandade e a desorganização da oposição

Passados alguns meses desde que assumiu o poder já era evidente o caráter autoritário de dr. Morsi e a influência da Irmandade no governo. Ainda que não tenha conseguido afastar a "ameaça" dos militares (Abdul Fattah Al-Sissi se tornou ministro da defesa) ele fez o que pôde (o general Hussein Tantawi foi aposentado compulsoriamente). Ademais, a disputa com o judiciário remanescente de Mubarak (por isso chamado de felul) era cada vez maior.

O único problema que Morsi não conseguia enfrentar era o da economia. Nem a ajuda do governo americano foi suficiente. O empréstimo do FMI não foi liberado porque as negociações emperraram. Enquanto isso o povo perecia e saía às ruas protestando contra o governo.

Não vendo outra saída possível, aqueles se intitulavam opositores formaram uma coalizão -- a Frente de Salvação Nacional -- capitaneada por Mohamed El-Baradei. A única coisa que os unia era a vontade de derrubar Morsi. Resultado: não houve qualquer discurso que pudesse ao menos propor uma alternativa para a população. Nada de propostas, apenas "Fora Morsi".

A gota d'água e a intervenção militar

Enquanto a oposição se concentrava em bater em Morsi e na Irmandade, a qualidade de vida dos egípcios ficava cada vez mais precária (o valor da libra caiu 25% em relação ao dólar desde o fim do governo Mubarak). Isso durou até o momento em que o povo resolveu dar um basta.

Durante todo o mês de junho os protestos se tornaram mais contundentes. A aliança de Morsi com o Al-Gama'a Al-Islamiya, um grupo assumidamente terrorista, só piorou as coisas. Na passada quarta-feira o presidente foi ridicularizado em público por seu discurso lamentável. O grupo Tamarod disse que juntou 22 milhões (!) de assinaturas pedindo sua saída. Os comícios organizados pela Irmandade foram insignificantes. 

Quando a situação política beirava o colapso os militares interviram. Após uma reunião com representantes da FSN, da Igreja Copta e muçulmanos, Abdul Fattah Al-Sissi, por volta de 21h00 horário local, anunciou as modificações e o plano político futuro para o Egito: (1) suspensão da Constituição; (2) eleições antecipadas serão realizadas; (3) a chefia do executivo ficará a cargo do presidente da Suprema Corte Constitucional (Adly Mansur); (4) será formado um governo de coalizão nacional; e (5) haverá uma comissão para analisar emendas à Constituição.

Em apoio à atitude dos militares e em tom conciliador falaram Mohamed El-Baradei, o papa copa Tawadros II e o grande imã de Al-Azhar, Sheikh Ahmed El-Tayyeb. Contudo, o que ainda preocupa é uma possível (e até provável) reação da Irmandade Muçulmana. O primeiro comunicado do grupo, que inclusive teve apoio do partido salafista Watan, dizia que este "golpe" não seria tolerado. E nem é preciso dizer que a Irmandade é uma organização extremamente forte e influente.

Concluindo: acho sim que a população tem motivos para comemorar (sobretudo os coptas) e vejo com bons olhos a intervenção militar. Só acho que este foi apenas o primeiro passo para os egípcios. Agora eles precisarão estar preparados pela resposta da Irmandade (seus partidários já cantaram "reação, reação, reação" depois do anúncio de El-Sissi) e para resistirem a este quadro econômico que ainda é demasiadamente complicado.

terça-feira, 25 de junho de 2013

Um "moderado" é eleito presidente do Irã

Hassan Rouhani.

Não sei se já repararam, mas sempre que a mainstream media se refere a um candidato iraniano ele é "moderado". Os ultraconservadores são aqueles que recebem poucos votos e nem se aproximam de se eleger. A impressão que tenho ao ler alguns jornais americanos (vocês já devem saber quais são) é que todos os candidatos iranianos são moderados. Ou seja, alguma coisa nisso tudo está errada!

A bola da vez é o recém-eleito Hassan Rouhani, que tem até twitter, um clérigo conhecido no Ocidente pelo seu apelido de "Sheikh Diplomata". Ele mesmo se declarou "moderado" e "reformador", palavras estas que só adoçaram NYT, Washington Post e cia limitada. Teve até colunista por aí pedindo uma aproximação do presidente Obama para com ele. 

Passemos agora, resumidamente, a analisar os feitos políticos do senhor Rouhani. Ele esteve no Conselho Supremo Nacional durante 16 anos e renunciou recentemente, ainda sob o mandato de Mahmoud Ahmadinejad*. O que indica claramente que detém a confiança do aiatolá Ali Khamenei. Vale destacar também que durante o governo de Mohammed Khatami (vejam só, outro moderado!) o "Sheikh Diplomata" foi colocado à frente da equipe nuclear iraniana e conseguiu, ao prometer suspensão de parte da atividade nuclear do país, um abrandamento nas sanções.

Quem pode melhor explicar o resultado de todo este esforço de Rouhani é o ex-presidente do Parlamento Abdullah Ramezanzadeh: "Nós tínhamos um acordo para a suspensão do enriquecimento, mas importávamos todas as peças necessárias para a atividade nuclear. Estávamos realizando todas as nossas políticas em duas frentes: uma para continuar as negociações de forma aberta mantendo os americanos longe delas, e outra para continuar nossas atividades nucleares e segredo."

Bom, para mim isso já bastaria para ter os dois pés atrás com este presidente "moderado". No entanto, a coisa não para por aí. Ainda tem mais. Conforme noticiou o Washington Times, Hassan Rouhani integrou uma força-tarefa iraniana responsável por planejar o atentando à AMIA (Asociación Mutual Israelita Argentina), em 1994, assassinando nada menos do que 85 pessoas. Sabem o que é pior? Ler matérias de jornalistas "respeitáveis" confiando em sua moderação porque ele não falou nada sobre Israel. Não falou mesmo. Mas fez coisa muito pior!

Algo que pode parecer meio contraditório aqui depois do exposto anteriormente é o fato de Rouhani se apresentar como moderado tanto dentro quanto fora do Irã. Sobre isso, e para concluir este pequeno texto, gostaria de citar a melhor análise que li tratando do assunto até o momento, feita por Reza Kahlili no WND:

"Um analista da inteligência da Guarda Revolucionária que desertou para um país escandinavo previu a seleção de Rouhani como próximo presidente uma semana antes da eleição e disse que o regime cria constantemente uma imagem de divisão dentro do seu sistema político entre os chamados conservadores e moderados. O objetivo de colocar o moderado Rouhani como vencedor era enganar o Ocidente mais uma vez através de uma nova esperança de que poderia haver negociações sobre o programa nuclear ilícito do Irã, disse ele, enquanto consegue ainda mais tempo para desenvolver armas nucleares, tornando-se assim, inatingível pelo Ocidente."

 Reparem como não é nem um pouco difícil enganar o Ocidente com esta tática. E tudo se torna ainda mais fácil com Barack Obama Presidente, John Kerry Secretário de Estado e Chuck Hagel Secretário de Defesa dos Estados Unidos.

*Pouco antes das eleições e vendo que sua guerra particular contra Ali Khamenei estava para ser liquidada, o presidente Mahmoud Ahmadinejad fez uma ameaça: se a candidatura de seu favorito não fosse aprovada pelo Conselho ele traria a público as provas de que houve fraude em sua eleição. Em resposta ficou preso por 7 horas, seu candidato não foi aprovado e até o momento ele calou a boca.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Qusayr caiu e levou consigo a moral dos rebeldes

Após 17 longos dias de batalha  Qusayr sucumbiu às forças de Bashar Al-Assad e do Hezbollah na quarta-feira (5), naquela que foi uma das derrotas mais duras para os insurgentes sírios. A cidade, que estava há cerca de um ano nas mãos dos rebeldes, servia como rota de abastecimento para suas tropas com suprimentos vindos do Líbano.

Qusayr localiza-se ao norte da fronteira com o Líbano e está próxima ao Vale do Bekaa. Era uma das poucas cidades do centro-sul da Síria que ainda estava sob o jugo dos rebeldes. Assim sendo, a mobilidade de tropas vindas do norte não foi uma surpresa. Para Assad o comando da cidade seria vital por três grandes motivos: (a) cortar a principal rota de abastecimento rebelde provinda do Líbano; (b) "limpar" o corredor que liga Damasco a Tartus e Latakia, cidades do noroeste sírio que são redutos da seita alauíta do presidente e que albergam grande parte de seus apoiadores (vale lembrar também que em Tartus está uma instalação estratégica naval russa); e (c) propiciar uma válvula de escape para que suas tropas tenham acesso também a Homs e de lá para outras áreas ao norte.

Reparem no corredor formado à esquerda.

A vital contribuição do Hezbollah

No mês passado o líder do grupo terrorista libanês Hezbollah, Sheikh Sayyed Hassan Nasrallah, gravou uma mensagem na qual deixava extremamente claro que apoiaria seu parceiro Bashar Al-Assad até as últimas consequências prometendo o envio de "dezenas de milhares de combatentes". Sua justificativa foi que o fluxo de estrangeiros nas fileiras rebeldes aumentou muito nos últimos tempos. E quanto a isso ele tem razão. O Syrian Human Rights Watch estima que 2.219 estrangeiros foram mortos lutando em nome dos rebeldes.

No entanto, o envio de militantes à Síria serviu também como uma espécie de laboratório para os terroristas xiitas. De 2006 para cá suas técnicas de treinamento foram modificas enfocando sobretudo táticas de guerrilha. Isso porque, segundo a própria liderança do grupo, tais artimanhas poderiam ser eventualmente utilizadas contra o "agente sionista".

A estratégia de guerrilha difere um pouco do antigo modus operandi do Hezbollah: nos anos de 1990 a luta ocorreu (contra israelenses) principalmente em territórios rurais, onde os milicianos precisaram aprender a se camuflar em um ambiente difícil de floresta densa; em 2006 os confrontos passaram a acontecer dentro de vilas e cidades, o que propiciou um aperfeiçoamento nas táticas de guerrilha (táticas estas que foram aprimoradas no Irã).

Qusayr era acessível para o Hezbollah.

Inicialmente, segundo Nasrallah, a constante movimentação de milicianos do grupo terrorista na região era apenas para "proteger civis libaneses". Mas logo que se viu que o objetivo era bem maior do que esse. No exato momento em que o exército de Assad começou a perder terreno em Homs, tropas mobilizadas em Hermel e no Vale do Bekaa foram prontamente acionadas para o apoio. O mesmo ocorreu em Qusayr.

No entanto, nesta última pudemos ter uma real dimensão do envolvimento dos terroristas xiitas e do quanto suas táticas recém-aprimoradas podem oferecer grande perigo a Israel futuramente. Citando um miliciano de nome Hajj Abbas, o jornal Daily Star forneceu mais detalhes sobre a batalha. O principal deles foi a efetividade do Hezbollah no confronto: o grupo terrorista utilizou cerca de 1.200 combatentes de suas forças de elite e comandou os ataques do solo, enquanto o exército de Assad ofereceu apoio aéreo. Engenheiros também foram mobilizados para, nas palavras do terrorista ao Daily Star, livrá-los de "maiores dores de cabeça" que poderiam ser acarretadas pelas armadilhas dos rebeldes.

A queda de Qusayr era uma questão de tempo.

Os rebeldes que lá estavam receberam reforços das brigadas Farouq, Al-Haqq, Mughaweer, Wadi, dos batalhões Quassion  e Ayman. Sobre o Jabaht Al-Nusra, poucos foram os que apareceram. Aproveitando a "fama" do grupo a mídia quis exagerar um pouco. De qualquer forma nem todo este deslocamento bastou para  que a cidade fosse mantida sob o jugo rebelde. A resistência foi brava, sem dúvidas, e eu diria até milagrosa. Mas contra milicianos bem preparados e que ainda contavam com grande auxílio do exército regular, seria impossível permanecer no comando de Qusayr.

Resultados políticos da batalha de Qusayr

Se a fragmentação do suposto Exército Sírio Livre (FSA na sua sigla em inglês) já era um motivo para a divisão política*, agora tudo ficará ainda mais complicado. Ainda que tenha perdido muitas cidades ao norte, a vitória sobre Qusayr foi uma das mais significativas até agora nesta guerra civil para Bashar Al-Assad.

Estamos no aguardo de uma nova reunião que resultará nas discussões de sempre sobre a saída imediata ou permanência de Assad, sua participação em um novo governo, etc. Enquanto isso, é bom lembrar que "oficialmente" o número de mortos já ultrapassa os 80 mil (para o SHRW estamos na casa dos 94 mil). E impasses nas negociações só irão gerar mais e mais mortos.

Outra consequência imediata da vitória de Assad com o apoio do Hezbollah é uma tendência ao aumento no número de combatentes estrangeiros pelo FSA (muitos deles jihadistas). É importante lembrar que o clérigo sunita do Qatar e pró-Irmandade Muçulmana, Sheikh Youssef Qaradawi, convocou todos os sunitas a lutarem contra Assad e contra o "Partido do Satã" (é assim que ele chama o Hezbollah, cujo nome significa "Partido de Allah").

*Com o passar do tempo e o aumento nas dificuldades para os rebeldes, a oposição fica cada vez mais dividada também no campo ideológico. Até o momento aqueles que, para os insurgentes, estão apresentando resultados são os extremistas islâmicos. Prova disso é o Jabaht Al-Nusra. Ademais, a Irmande Muçulmana também cresce exponencialmente dentro da oposição. Logo que Ghassan Hitto foi eleito PM interino da Coalizão Nacional Síria, o clérigo Moaz Al-Khatib (figura muito respeitada no Ocidente) renunciou.

domingo, 9 de junho de 2013

Lee Rigby: mais uma vítima do extremismo islâmico

Preciso dizer alguma coisa?

Há poucos dias um soldado britânico foi atropelado e em seguida esfaqueado em Woolwich, sudeste de Londres. Bem no meio da rua. Os dois agressores não fugiram ou tentaram esconder o que fizeram. O soldado se chamava Lee Rigby, tinha 25 anos e deixou para trás um filho de 2 anos de idade.

Inicialmente os transeuntes se mostraram atônitos com tamanha barbaridade. No entanto, uma mulher, ao perceber que havia uma escola por perto e que crianças poderiam chegar naquele momento, começou a falar com um dos agressores e perguntar qual o motivo daquilo. A senhora Ingrid Loyau-Kennett, líder dos escoteiros, manteve a compostura e segurou o nervosismo quando um dos homens disse, "queremos começar uma guerra em Londres esta noite".

Tendo verificado que o soldado Rigby já estava morto, a senhora Loyau-Kennett se dirigiu até o agressor: "Então eu pensei, 'ok, eu não sei o que está acontecendo aqui', e ele estava coberto de sangue. Pensei que era melhor começar a falar com ele antes que atacasse mais alguém. Imaginei que estas pessoas geralmente têm uma mensagem, então eu disse 'o que você quer'?"

"Perguntei se ele fez isso e me disse que sim e então eu disse por que? Ele me respondeu  que era porque ele (Rigby) matou muçulmanos em países muçulmanos. Ele afirmou que era um soldado britânico, eu confirmei e então ele disse 'eu matei porque ele matou muçulmanos e eu estou farto de pessoas que matam muçulmanos no Afeganistão e ninguém faz nada lá'"

Mesmo recebendo inúmeras chamadas de pessoas que estavam no local, os policiais, surpreendentemente, tardaram vinte minutos para se dirigirem até lá. Logo que chegaram foram forçados a alvejar os dois que são tratados como "suspeitos" do caso: Michael Adebolajo, britânico de origem nigeriana, e Michael Adebowale. Existem mais informações sobre o primeiro. Segundo a imprensa britânica ele se converteu ao islamismo há pouco mais de 10 anos e recentemente foi preso no Quênia quando tentava rumar à Somália. As autoridades quenianas confirmaram que Adebolajo iria se encontrar com membros do grupo terrorista Al-Shaabab, ou seja, ele já estava na mira do MI5.

Mais testemunhas presentes na cena do crime disseram que ambos gritavam "Allahu Akbar" (Allah é grande). Logicamente em toda e qualquer investigação policial faz-se mister ter muita cautela em divulgar as informações preliminares do caso, tendo em vista que imprecisões de julgamento ocorrem. O problema é que este ato foi claramente terrorista e sua motivação foi a já conhecida Jihad.

O editor de política da BBC, Nick Robinson, inicialmente descreveu os assassinos do soldado Rigby como "tendo aparência muçulmana". Foi exatamente assim que, segundo o jornalista, uma testemunha que estava no local relatou a ele por telefone. Tão logo a descrição foi feita a BBC passou a receber inúmeras reclamações de racismo, xenofobia e, logicamente, da boa e velha "islamofobia".

Antes de mais nada eu pergunto: alguém que, após matar outro ser humano no meio da rua, grita Allahu Akbar e diz claramente que está vingando a morte de muçulmanos no Afeganistão é o que? Evangélico? Católico Romano? Copta? Maronita? Não! É muçulmano!

É impressionante como certas pessoas generalizam as coisas com uma simples declaração. Ele disse que os assassinos tinham "aparência muçulmana". Apenas isso. Não disse que todos os muçulmanos que vivem neste mundo foram responsáveis pela morte de Rigby. É como se um católico atacasse uma pessoa que não é de sua religião e todos os outros fossem responsabilizados de igual forma por isso. Mas a história não acaba por aí. O senhor Robinson precisou se desculpar publicamente pelas declarações. Se isso não é censura, meus amigos, já não sei que significado atribuir a este evento.

Outra atitude repentina -- e já comum -- por parte de especialistas no assunto é dizer que se trata de um "ataque isolado". Com a morte de Rigby não foi diferente. Mas esta hipótese caiu por terra quando mais 10 homens foram presos sob suspeita de conspiração no assassinato do jovem soldado britânico.


"Não há nada no Islã que justifique este ato verdadeiramente terrível", David Cameron

O premiê inglês tratou de se apressar em desvincular completamente a religião islâmica do atentando terrorista em Woolwich. Pronunciamentos de caráter teológico como este são bastante comuns para não gerar desconforto e medo generalizado nos cidadãos britânicos muçulmanos e não-muçulmanos. Mas não há mesmo qualquer ligação entre o Islã e extremismo? A resposta é sim e não.

Como disse Douglas Murray, "há uma guerra civil em andamento no Islã, que ocorre desde a sua fundação. Esta guerra é entre aqueles que leem sua religião literalmente e aqueles que leem-na metaforicamente". Confesso que fazia tempo que não lia algo que resumisse tão bem a situação do Islã. Murray ainda completou enfatizando que a maioria dos muçulmanos residentes na Grã-Bretanha encontram-se no segundo grupo. 

Em se tratando de Grã-Bretanha, mais especificamente, temos o mesmo problema que ocorre em outros países ocidentais: o aliciamento ao terrorismo e a tentação da Jihad. Ainda que levemos em consideração o fato de uma minoria muçulmana no Ocidente estar próxima a este radicalismo, as políticas contraterroristas de todos os países têm sido vergonhosas! Vimos isso com os irmãos Tsranaev em Boston, Mohamed Merah em Toulouse e com os adolescentes belgas que foram combater na Síria. 

Muitos tratam do assunto como ~teoria da conspiração~ mas o lobby de organizações muçulmanas é extremamente forte. Querem um exemplo? As duas  recentes Conferências Islâmicas Alemãs foram um verdadeiro fracasso porque os membros da organizações muçulmanas nem mesmo quiserem ouvir representantes do governo. Os temas que deveriam ter sido abordados eram o casamento forçado e o radicalismo. Quanto a este segundo, referente ao encontro de 2013, o presidente da DITIB (União Turco-Islâmica para assuntos Islâmicos), Bekir Alboga, disse que achava ridículo ligar o Islã ao radicalismo e que a culpa de eventuais extremistas deveria ser atribuída ao governo alemão por não tomar qualquer medida visando o fim da "islamofobia".

Enquanto a ligação entre o Islã e o extremismo por parte de pessoas que se declaram adeptas de religião continuar como um tabu, mais e mais ataques serão perpetrados e sangue de pessoas inocentes como Lee Rigby, as crianças judias de Toulouse e as vítimas de Boston será derramado.


domingo, 26 de maio de 2013

O contraterrorismo de Barack Hussein Obama

Nesta quinta-feira (23) o presidente americano Barack Obama fez mais um de seus célebres discursos. Mesmo com a ameaça de impeachment (coisa que a mainstream media não noticia) ele pareceu calmo e falou sobre o combate ao terrorismo.

Logo no início fez questão de enfatizar que soldados americanos agiram contra o Estado de Direito quando se utilizaram da tortura para com certos prisioneiros. O interessante é que se esqueceu de falar o que os terroristas fizeram com sua própria população (seja no Iraque ou no Afeganistão) e até mesmo com soldados americanos quando estes caíram em suas mãos.

"Não houve ataques em larga escala contra os Estados Unidos e nossa pátria é mais segura". Se com ataques em larga escala ele quis dizer que não houve outro World Trade Center, acertou. Mas o número de pequenos ataques aumentou. Outro detalhe: nos primeiros quatro anos desde a tomada de posse de Obama, morreram quase três vezes mais americanos no Afeganistão do que nos oito anos da administração Bush. E a política de retirada do Iraque? Bom, quanto a esta melhor nem tocar no assunto.

"Agora, não se enganem, o nosso país ainda é ameaçado por terroristas. De Benghazi a Boston, temos sido tragicamente lembrados de que isso é verdade". Finalmente! Ele admitiu algo que preste. E digo mais: o fato de colocar Benghazi nisso tudo já é uma grande coisa, tendo em vista que a primeira atitude de sua administração foi mentir sobre o ataque terrorista à instalação diplomática que vitimou quatro americanos. Pena que não poderemos esperar nada mais do que isso. Falar sobre negligência? Jamais! Omertà.

"Hoje, o núcleo da Al-Qaeda no Afeganistão e no Paquistão está no caminho para a derrota. Seus agentes restantes gastam mais tempo pensando sobre sua segurança do que conspirando contra nós. Eles não dirigiram os ataques em Benghazi ou Boston. Eles não realizaram um ataque bem sucedido a nossa pátria desde 11 de setembro" (grifo nosso).

Creio que esta, sem dúvidas, foi uma das partes mais interessantes do discurso. Disse que o núcleo da Al-Qaeda no Afeganistão e no Paquistão estão caminhando para a derrota. Aí o senhor Obama declara que a Al-Qaeda não teve relação com os ataques em Boston ou Benghazi. É mesmo, "presidente"? Então façamos agora uma pequena recapitulação da história: o ataque em Benghazi esteve sob a responsabilidade do grupo terrorista Ansar Al-Sharía, que é filiado à Al-Qaeda.  Quanto a Boston, é provável que dificilmente saibamos mais detalhes. Aquele jovem saudita, Rahman Ali Alharbi, que inicialmente era uma "pessoa de interesse" no caso e depois foi deportado por "problemas com o visto" já foi esquecido pela grande mídia. Em seu programa diário Glenn Beck disse que teve acesso ao relatório do FBI onde constava que Alharbi deveria deixar o país por ligação ao terrorismo.

Em uma fala posterior Obama trata a respeito das ramificações da Al-Qaeda no Iraque, no Iêmen, na Somália e no Norte da África. Esta é uma questão muito delicada, pois sabemos que estes grupos estão administrativamente separados, porém ideologicamente unidos. Ou vocês acham que os membros da Al-Qaeda na Península Árabica deixaram de comemorar a morte do embaixador Stevens?

O comandante-em-chefe ainda menospreza a expressão "guerra ao terror", preferindo descrever as ações como "uma série de esforços persistentes direcionados para desmantelar as redes específicas de extremistas violentos que ameaçam a América". Mais politicamente correto impossível! Mas se ele não quer utilizar a expressão "guerra ao terror", poderia falar algo como o combate à Jihad que visa transformar o Ocidente em um grande califado. Não estou dizendo que a religião islâmica é assim, mas a interpretação ortodoxa de alguns trechos do Alcorão fazem com que seus adeptos pensem assim. Estejam eles em constante contato com terroristas no Oriente Médio ou mesmo morando nos Estados Unidos, como foi o caso dos irmãos Tsarnaev, responsáveis pelo ataque em Boston. E ai daquele que pense o contrário! A pena para um apóstata da fé islâmica não é lá muito leve...

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Ninguém sabia de nada

Steven Miller e Douglas Shulman.

Há poucos dias estourou nos Estados Unidos outro escândalo envolvendo a administração Obama. Depois da negligência na Líbia e dos grampos a jornalistas da AP, o Internal Revenue Sistem (IRS), serviço de receita do Governo Federal, é a bola da vez. O IRS é acusado de submeter, desde 2010, grupos conservadores que solicitavam o benefício da isenção fiscal a intenso escrutínio, o que resultava, muitas vezes, na não legalização dos grupos.

Para quem não está acompanhando o caso, vamos por partes. Nos Estados Unidos determinadas organizações de pequeno porte podem pedir isenção fiscal caso comprovem que suas atividades estejam ligadas ao "social welfare" -- status 501 (c) (4)--, com lucro líquido dedicado exclusivamente a fins beneficentes, educacionais ou recreativos. Tais organizações podem assumir posições também em questões polêmicas que envolvam mudança na legislação ou mesmo tomar parte de algum lado político. Este último quesito, inclusive, deve ser levado em consideração na análise do IRS Scandal.

Em resumo, se uma organização é Democrata ou Republicana mas tem como seu principal escopo o "social welfare", ela pode se isentar fiscalmente passando pelo escrutínio do IRS. Mas aí é que começa a polêmica. Desde 2010 grupos conservadores vêm passando por uma exagerada e intensa sabatina -- alguns precisam revelar os nomes de familiares, locais das reuniões, temas das reuniões, etc -- que só servia, no final das contas, para negar-lhes autorização (ou nem mesmo conceder qualquer resposta). Basicamente aqueles em que constavam os termos "Tea Party" e "Patriot" foram os que mais sofreram nas mãos do IRS. Houve também relatos de perseguição a grupos pró-vida, judeus e até uma professora católica crítica do presidente Obama.

A posição inicial do "senhor e salvador" Barack Obama foi que ele ficou sabendo do ocorrido pelo noticiário. Em seu mais recente comunicado o porta-voz da Casa Branca, Jay Carney, afirmou que o conselho da presidência soube apenas no final de abril acerca de "um relatório prévio" do caso. Carney disse que a assessora jurídica Kathryn Ruemmler teve conhecimento da auditoria no dia 24 de abril, passando a informação a Denis McDonough, chefe da equipe de Obama, que por sua vez não informou ao presidente. Nas palavras do porta-voz da Casa Branca, "este não é o tipo de coisa que exige notificação ao presidente".

O interessante disso tudo é que aprendemos que americanos morrendo em território estrangeiro sob ataque terrorista e perseguição a grupos de oposição não são o tipo de coisa para se notificar ao "presidente" dos Estados Unidos. Aliás, ele não se manifestou também sobre o caso do criminoso abortista Kermit Gosnell. Quanta inocência a deste chefe do Executivo, não?

Acreditem, meus caros, a história não para por aí. Nesta terça-feira (21), a Comissão de Finanças do Senado --que abriu uma investigação bipartidária do IRS Scandal-- ouviu Douglas Shulman, Steven Miller, ex e atual comissários do IRS, respectivamente, e J. Russell George, inspetor-geral do Departamento do Tesouro para a administração fiscal. O Senador Orrin Hatch, R-Utah, que chefia a Comissão ao lado de Max Baucus, D-Mont., não mediu palavras desde o início acusando Miller de omitir os fatos. Ele, por sua vez, disse que não mentiu.

Também visivelmente irritado estava o Senador Max Baucus. Ele perguntou a Shulman por que ninguém foi demitido já em 2011, quando a sede do IRS em Washington teve conhecimento da segmentação de grupos do Tea Party. O ex-comissário disse que "em junho de 2011, eu acredito que não estava ciente disso". Ainda mais indignado, o Senador de Montana replicou: "Você foi o comissário. Se você não sabe, parece que alguém não fez o seu trabalho direito".

Basicamente durante toda a audiência Miller e Shulman alegaram amplo desconhecimento do caso, vindo a saber das investigações apenas na primavera de 2012. Justo quando, segundo eles, tomaram conhecimento de que funcionários do IRS estavam usando palavras-chave como "Tea Party" para determinar quais grupos deveriam passar por uma "sabatina extra".

Quarta-feira (22) foi o dia de tentarem ouvir Lois Lerner, que lidera o escritório do IRS e foi a primeira a divulgar que os grupos com "Tea Party" e Patriot" eram alvos do serviço, mas ela se manteve em silêncio. A única coisa que fez foi dar uma curta declaração: "Eu não fiz nada de errado, eu não violei qualquer lei ou regra do IRS e não forneci informações falsas para esta ou qualquer outra comissão do Congresso".

Falando sobre o assunto Wayne Allyn Root, que também foi vítima do IRS, fez um questionamento: "será mesmo que o IRS que perseguiu grupos conservadores, do Tea Party, doadores do Partido Republicano, judaicos, cristãos, pró-vida e críticos sinceros do presidente (como eu), agora usará o Obamacare para nos negar assistência médica?" O Obamacare, para quem não sabe, também está nas mãos do IRS.

Post publicado em minha coluna no site da Reaçonaria

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Pior do que Watergate!

Gregory Hicks.
 Esta foi a expressão que ecoou em minha cabeça durante toda a semana passada ao ouvir os depoimentos de representantes americanos na Líbia sobre a morte do embaixador Christopher Stevens e mais três pessoas nos ataques ao consulado em Benghazi, no dia 11 de setembro de 2012. Seria uma expressão exagerada? A meu ver, não. Isso porque, nas palavras de Glenn Beck, "em Watergate ao menos nenhum americano morreu".

Os ataques tiveram seu início na noite de 11 de setembro e continuaram até a manhã do dia seguinte, com intensa pressão por parte dos jihadistas do grupo Ansar Al-Sharia, representante da Al-Qaeda na Líbia. Logo que a notícia da morte dos quatro americanos se espalhou pelo mundo a administração Obama tratou de culpar o filme The innocene of Muslims, alegando que sua divulgação causou inúmeros protestos em todos os países islâmicos e que era um abuso da liberdade de expressão.

Ao cabo de tudo, o criador do vídeo foi preso -simplesmente por se utilizar do seu direito de liberdade de expressão- e, dentre os terroristas que atacaram os consulados americanos, pouquíssimos foram identificados. Agora parem para pensar: 11 de setembro de 2012. Vocês acham mesmo que os muçulmanos estavam preocupados com este vídeo? Ademais, protestos de caráter repentino poderiam fazer tanto estrago como fizeram? Eu, particularmente, custo a acreditar nisso. Não descarto a hipótese para outras embaixadas, mas definitivamente não foi o que aconteceu em Benghazi.


Para piorar ainda mais a situação, a administração Obama foi basicamente negligente não enviando apoio militar aos americanos que estavam sob ataque mesmo sabendo das circunstâncias. Quem disse isso foi ninguém menos do que Gregory Hicks, ex-vice chefe do Departamento de Estado para a missão na Líbia. Em suas palavras, "um movimento rápido sobre aviões em Benghazi poderia muito bem ter evitado algumas coisas ruins que aconteceram naquela noite". Ele quis dizer que havia tempo para que tropas de apoio fossem enviadas à cidade líbia para salvar a vida dos americanos que estavam sofrendo um ataque terrorista orquestrado.

"Na noite em que ocorreu o incidente, eu estava em minha mesa no final do dia (em Trípoli) quando chegaram os primeiros relatos de que as instalações diplomáticas em Benghazi estavam sendo atacadas", relatou Hicks. Ele ainda continuou salientando que "mais tarde, quando eu ouvi que o embaixador Stevens estava em um lugar seguro e que não poderia ser contactado, recomendei para a Casa Branca uma equipe de apoio". Interrompo a declaração do senhor Hicks para perguntar: que lugar seguro seria este? De uma forma ou de outra, o embaixador foi assassinado.

Mas o relato chocante não para por aí. Ao sugerir a equipe de apoio para Benghazi, Hicks recebeu como resposta que esta alternativa "estava fora da mesa de operações". Como traz à baila a matéria do WND, nas primeiras horas da manhã do dia 12 de setembro, tendo em vista que o ataque ainda continuava, Hicks ficou frustrado pela negação de um pedido urgente para despachar tropas de Operações Especiais de Trípoli a Benghazi para ajudar na evacuação segura dos americanos.

"Que diferença isso faz?", perguntou Hillary Clinton.
O Congressista Jason Chaffetz, R-Utah, perguntou então "como o pessoal reagiu com a negação da ajuda" e a resposta de Hicks foi que "eles estavam furiosos". O ex-vice chefe do Departamento de Estado contou também que, caso os aviões da base aérea de Aviano (Itália) fossem enviados demorariam cerca de duas ou três horas para chegar. O problema é que não havia aviões-tanque disponíveis para abastecimento. Na sequência, Chaffetz rebateu: "é impressionante como ninguém na administração Obama resolveu pedir à Líbia permissão para utilizar seu espaço aéreo para salvar a vida de nosso embaixador".

Sobre o vídeo, todos os três depoentes -Hicks, Eric Nordstrom e Mark Thompson- concordaram que não possuía nenhuma relação com os ataques. Nas palavras de Hicks, "o vídeo não foi o instigador do que estava acontecendo na Líbia, nós não vimos manifestações relacionadas a ele em qualquer lugar da Líbia". Quanto às declarações de Susan Rice culpando o filme em cinco talk shows diferentes, Hicks disse o seguinte: "eu estava atordoado, meu queixo caiu. Eu estava com vergonha".

Depois destas impactantes palavras, ficou extremamente clara a negligência por parte da administração Obama na resolução do caso. Mas isso não é tudo. A pergunta que faço é por que, sabendo dos ataques intensos e do risco de morte para os americanos, ninguém autorizou o envio de apoio a Benghazi? Esta é uma dúvida que, provavelmente, ainda ficará no pensamento de muitas pessoas.

domingo, 5 de maio de 2013

Dissuadir é preciso

Montanhas Quasyon.

Atualização

Na noite de sábado (início da madrugada de domingo em Damasco) fortes explosões foram ouvidas na capital síria. Explosões estas que, segundo informações preliminares, tinham como alvos depósitos de armas do exército de Bashar Al-Assad. Um pouco antes, na sexta-feira (4), a imprensa internacional disse que Israel atacou outro carregamento de armas que iria parar nas mãos do Hezbollah.

Antes de mais nada, vamos esclarecer esta situação. O primeiro ataque visou destruir uma carga de mísseis Fateh 110 de fabricação iraniana que estavam sendo transportados para o Líbano. Vale lembrar que em janeiro o mesmo aconteceu. E, além do carregamento, o "centro de pesquisa militar" (nome bonito para depósito de armas) de Jamraya, nos arredores de Damasco, também foi alvo. Apesar de não existir confirmação oficial, atribuiu-se o ataque a Israel.

No entanto, as explosões de domingo tiveram um significado muito maior. Elas atingiram o coração do regime de Assad. Tão logo ocorreram já foram atribuídas pelo regime a Israel, tendo em vista que populares afirmaram (segundo a Al-Jazeera) ter visto um avião nos arredores da capital síria. Ora, até onde sabemos os rebeldes ainda não possuem caças e nem capacidade para realizar um ataque assim. Curiosamente um dos alvos foi mais uma vez o "centro" de Jamraya. Sinal de que o trabalho de janeiro não foi bem feito. Outra explosão aconteceu nas montanhas de Quasyon, reduto militar de Assad na capital.

Como consequência do ataque os rebeldes rapidamente ganharam muitas posições em Damasco e relata-se que uma reunião de urgência foi organizada pelo regime. Segundo fontes independentes, pessoas ligadas ao círculo íntimo do presidente deixaram a capital ainda na madrugada de domingo (o que me parece difícil de acreditar). Inicialmente foi prometida uma resposta oficial na TV síria às cinco da manhã, mas  não ocorreu nem sequer um pronunciamento.

O Ministro Omran Al-Zoabi apareceu para protestar dizendo que o ato significava uma clara associação de Israel com os terroristas e que era uma violação das leis internacionais (e matar mais de 70 mil pessoas não é uma violação, senhor ministro?). Tirando isso o silêncio por parte dos membros do regime seguiu.

Israel

Como mencionado acima, o ataque perpetrado em janeiro não foi confirmado oficialmente até hoje. Do mesmo modo as explosões de Damasco foram ligadas a Israel primeiramente pela mídia estatal e depois por outros veículos como a Reuters e a NBC. Algumas citaram, inclusive, fontes americanas e israelenses. De uma forma ou de outra, a confirmação oficial é o de menos.

O que precisamos analisar aqui é o contexto em que tais ataques ocorreram e principalmente sua razão. Israel queria simplesmente evitar que mísseis chegassem às mãos do Hezbollah? Este sem dúvida é um bom motivo, mas não o único. Acredita-se que o grupo terrorista libanês não tenha tanto acesso aos Fateh 110, que são mais modernos (pode ser que exista até uma quarta geração deles recém-fabricada no Irã), como tem aos Scud. E isso, por si só, já seria uma razão para Israel ter de se defender. 

No entanto, o armamento para o Hezbollah fica até em segundo plano quando analisamos tudo que envolve este ato de legítima defesa do Estado Israelense. Há alguns dias a imprensa divulgou declarações de um funcionário da Defesa de Israel onde ele dizia que o Irã acabara de ultrapassar a linha vermelha anunciada pelo premiê Benjamin Netanyahu. Neste ínterim aconteceu justamente a viagem de Chuck Hagel a Israel e, na sequência, o PM anunciou que Teerã ainda não chegou ao estágio mais perigoso. Curioso, não? Mas no meio disso tudo pudemos perceber que a viagem de Hagel serviu como um puxão de orelha ao governo israelense, o qual não poderia tomar qualquer atitude sem o apoio (leia-se autorização) dos americanos.

Esta bronca, num primeiro momento, deixou de Israel de mãos atadas. Mas havia ainda uma alternativa: a Síria. Não é mais segredo para ninguém que terroristas iranianos e do Hezbollah operam em solo sírio (na semana passada cerca de 30 militantes da facção libanesa foram mortos lutando por Assad). Ou seja, um pequeno aviso mostraria para aqueles que tanto odeiam os israelenses que estes estão dispostos a se defender sem precedentes. E isso dá certo? Seguramente! Nas palavras de um especialista, o Brig. General Zvika Fogel, "24 horas após o ataque na Síria, pelo menos de acordo com as fontes estrangeiras, Teerã, Damasco e o Hezbollah estão ocupados com controle de danos, verificando se há vazamento de informações e, principalmente, frustrados por não poderem retaliar".

O artigo do senhor Fogel é o mais esclarecedor sobre o tema. Se Israel não pode atacar o Irã, que mostre ao menos sua disposição para a defesa. Ademais, Fogel menciona ainda que a única maneira de lidar com regimes terroristas é por meio da dissuasão. Só assim seus líderes ficam acuados e pensam duas ou três vezes antes de responder.

A dissuasão é válida também quando se está sozinho. A omissão do governo de Barack Hussein Obama no que tange política externa -e sobretudo as relações com Israel- é algo assustador. Contudo, prefiro não entrar no tema agora. Para encerrar, acho pouco provável que jornais israelenses (exceto o Israel Hayom) tratem deste ato de defesa como deveriam, tendo em vista o ódio que sentem por Netanyahu. Mas uma coisa é certa: o compromisso com a proteção por parte do premiê é algo admirável e digno de aplausos.

sábado, 27 de abril de 2013

Se não é a Irmandade, quem então persegue os coptas?

No passado dia 14 fiz uma análise sobre as raízes do sectarismo no Egito que veio a ser publicada também na "Coluna do leitor" no portal da Reaçonaria. Gostaria, inclusive, de agradecer aos que me deram espaço para publicar o texto. Hoje me deparei com o tweet de Alice Salles dizendo que havia um post em resposta ao meu.

O texto em questão é do jornalista José Antônio Lima, que trabalha na revista CartaCapital e cobriu parte dos protestos que culminaram na queda de Hosni Mubarak. A crítica de Lima foi  postada em seu blog "Oriente Médio em Foco".

Nos parágrafos iniciais Lima comenta o caso de Al-Khasous que usei para introduzir a questão da perseguição aos coptas e a fala de Dom Rafael. No entanto, ele dá a entender que generalizo a questão atribuindo a violência contra os cristãos a todos os muçulmanos. Se passei esta impressão, me retrato agora: não disse que todos os muçulmanos egípcios perseguem os coptas, mas afirmo que é uma quantia bastante considerável. Nunca é demais ressaltar que os cristãos atualmente são os que mais sofrem perseguição por causa de sua fé. Neste link segue uma lista de atentados contra os mais diversos grupos cristãos desde 2001.

Já que se faz necessário, vou citar apenas um absurdo caso e seus motivos ainda mais assustadores. Em 2011 os responsáveis pelo poder local de Edfu aprovaram a reforma da Igreja de São George, construída há quase um século durante a "Idade de Ouro Cristã". A Igreja apresentava, inclusive, riscos aos fiéis tendo em vista o estado da edificação. Foi só o projeto ser aprovado que começaram os protestos por parte dos muçulmanos. Dentre suas primeiras reivindicações estava a abolição de cruzes e sinos, porque elas "irritavam os muçulmanos e seus filhos". Em seguida foram mais além, dizendo que a cúpula da Igreja deveria ser demolida. Com a recusa do bispo, houve intensos protestos dos muçulmanos, que ameaçaram demolir a Igreja e construir uma mesquita em seu lugar. Como se não bastasse isso, os coptas foram proibidos de sair de suas casas até que a cúpula fosse removida.

O ápice do embate se deu em dezembro do mesmo ano quando 3 mil muçulmanos, após as orações de sexta na Igreja, incendiaram e demoliram a cúpula. Focos do incêndio se espalharam por casas próximas e ainda houve saques. Até mesmo o governador da vizinha Aswan concedeu uma entrevista a TV negando qualquer incêndio e dizendo "que os coptas cometeram um erro e foram punidos". Que erro seria esse? Provavelmente não ser muçulmano.

Para que tudo fique ainda mais claro, grandes intérpretes da Sharia -os ulemás- que servem de referência aos islamistas proferiram seus pareceres com respeito aos cristãos. Um deles foi Ibn Taymiyya, confirmando que "os ulemás das quatro escolas de Direito -Hanafi, Shafi'i, Maliki e Hanbali- concordaram que se o iman destrói todas as igrejas em terras tomadas pela força, como Egito, Sudão, Iraque, Síria...isso não seria injusto". Taymmiya acrescenta ainda que, se os cristãos resistirem, eles "perderão sua aliança, sua vida e seus bens". 

Mais casos podem ser encontrados no estudo "Death to Churches Under Islam: A Study of the Coptic Church", que conta as origens do sectarismo contra os coptas e cita inúmeras informações do famoso historiador muçulmano Taqi Al-Din Al-Maqrizi.

Ascensão da Irmandade e sua rede de contatos

Lima diz que atribuo apenas à Irmandade Muçulmana "um problema que é do Egito". Isso não é verdade, tanto que também citei as políticas de Gamal Abdel Nasser e Anwar Al-Sadat que foram, para dizer o mínimo, contraditórias. O que não se pode negar de forma alguma é a natureza fundamentalista da Irmandade que se engendrou, desde 1928 (ano de sua fundação como mencionei também em meu texto anterior) no seio da sociedade egípcia. Sempre é válido lembrar que foi Hassan Al-Banna quem disse: "o voto para as mulheres é a rebelião contra o Islã e a humanidade".

Dizer que o governo se mostra, "por enquanto, incompetente" para lidar com o problema dos coptas é um eufemismo. Há casos evidentes de incitação à violência contra os coptas por parte de membros da Irmandade Muçulmana. Atualizações a respeito podem ser conferidas no twitter do ativista político copta Dioscorus Boles. Vale a pena ler também a entrevista do Papa copta Tawadros II concedida a Reuters nesta semana.

Em se tratando das relações dos muçulmanos com a Alemanha Nazista, Lima me contraria dizendo que "meia palavra não basta". Pois bem. Passo a discorrer sobre o tema. Como já salientei, a Irmandade Muçulmana foi financiada com recursos vindos diretamente do regime Nazista. Mas por que este interesse nos fundamentalistas islâmicos? Usar a definição de "o inimigo do meu inimigo é meu amigo" vem a ser ainda mais simplista ao abordar este tema.

Não nego que certos princípios em comum nortearam as relações de afinidades entre nazistas e muçulmanos. Mas não foi apenas isso. Em seu livro "A Mosque in Munich", o jornalista Ian Johnson traz mais detalhes sobre a ascensão da Irmandade, os quais comentarei aqui. Vamos por partes. Johnson começa dizendo que a aliança muçulmano-Nazista teve seu início com a repressão dos primeiros por parte do regime soviético. De olho no petróleo do Cáucaso e no apoio da oprimida comunidade muçulmana, Hitler viu uma oportunidade de ser o "salvador" e ofereceu seu apoio. Os laços se intensificaram ainda mais graças ao anti-semitismo enraizado nas duas partes.

Algo que Lima faz com muita precisão em seu texto é citar Hajj Amin Al-Husseini, o grande mufti de Jerusalém. Ele foi conhecido por ser uma figura proeminente do movimento islamista radical, dando impulso a inúmeras revoltas e mantendo estreitos laços com nomes de alto prestígio junto a Adolf Hitler (relata-se Adolf Eichman e Heinrich Himmler). Husseini foi ainda o responsável pela criação da divisão Handzar dentro da SS, composta por muçulmanos da Iugoslávia.

Como bem lembrado por Lima, "muitos palestinos serviram no exército britânico e centenas de milhares de árabes do Império Francês lutaram pela libertação da França". Quanto aos palestinos, ainda consegui números: foram cerca de 6 mil os que lutaram pelo exército britânico. Ademais, cerca de 26 mil voluntários muçulmanos e judeus serviram lado a lado pelos aliados. Tais informações jamais podem ser dispensadas.

Mas, concomitantemente a isso, Husseini via crescer cada vez mais seu poder em todo o Oriente Médio. Só na Palestina ele exterminou 11 clãs que faziam oposição a suas políticas e não viam com maus olhos a chegada de judeus. Ademais, o grande mufti teve vasta influência sobre a Irmandade Muçulmana ainda em seus primeiros estágios.

É normal que, em meio a isso, se faça uma pergunta: se a Irmandade foi próxima do regime Nazista, porque nenhum governo ocidental tentou coibi-la ou incentivar outros movimentos? Este questionamento, inclusive, foi um dos primeiros a brotar em minha mente tão logo iniciei os estudos a respeito do tema. Para respondê-lo, volto a citar o livro de Johnson. 

Segundo o autor, o governo americano viu nos movimentos políticos islamistas uma oportunidade para conter o avanço do comunismo (que seria o passo prévio a derrubada). Em primeiro lugar os EUA trabalharam com imigrantes muçulmanos ex-nazistas não-russos com sede na Alemanha. Posteriormente, vendo o sucesso de tal empreendimento, os muçulmanos também estiveram presentes no segundo passo de combate ao comunismo, envolvendo operações secretas, guerra econômica, sabotagem e propaganda.

Johnson escreve que o ano de 1953 foi fundamental para a Irmandade Muçulmana, quando, antes de uma conferência em Princeton, os líderes do movimento pediram uma audiência com ninguém menos do que o presidente Eisenhower. Para que isso pudesse ocorrer, logicamente, os dois lados "apagaram" quaisquer envolvimentos do então líder da Irmandade, Tariq Ramadan, com Husseini e Al-Banna. A reunião entre ambos era mesmo urgente e, principalmente, inevitável, tendo em vista que, neste período, a União Soviética estava revendo suas políticas com relação os muçulmanos, financiados algun imãs a seu favor. 

Ramadan foi, neste contexto, a voz que os EUA precisavam para combater o avanço do comunismo no Oriente Médio. Se esta política deu certo para os americanos não podemos afirmar, mas para a Irmandade sim. Com o dinheiro angariado através de seu proselitismo, Ramadan conseguiu financiar a construção de mesquitas e criou uma extensa rede de controle para a Irmandade, incluindo uma revista com função de propaganda, uma organização estudantil e a Liga Muçulmana Mundial. Em outras palavras, a militância muçulmana tomou grande corpo também no Ocidente.

Mas então quer dizer que a Irmandade não mudou?

Sim. Mas foi uma mudança "para inglês (ou americano não é mesmo, senhor Obama?) ver". E deu certo. Tanto que os Estados Unidos continuam financiando a organização mesmo com seu caráter sectário. Lima adverte que há divergentes facções dentro da Irmandade e chama atenção ainda para o fato de que a facção dita "mais conservadora" assumiu o controle do grupo, "afastando os mais moderados das decisões".

Concordo que há divergências dentro da Irmandade, mas acredito também que as convergências sejam bem maiores. Explico: antes de começarem a discutir entre si é necessário tomar e estabelecer o poder, juntamente com a Sharia. Só no final das contas, quando o objetivo maior for alcançado é que eles deverão parar para colocar suas divergências sobre uma balança.

Nunca podemos esquecer que Mohamed Morsi, presidente do Egito e membro da Irmandade, foi quem disse que "judeus são descendentes de porcos e macacos". Esta é a tolerância da entidade? É assim que um governo democrático lida com as diferenças?

Para finalizar meu longo texto, reitero que Lima utilizou a palavra "moderados" para se referir a membros da Irmandade que, segundo ele, foram afastados das decisões. Acho importante dizer que, em se tratando de Irmandade Muçulmana, não consigo imaginar alguma membro que seja realmente "moderado". Ora, o Dr Wagdi Ghoneim, personagem de grande influência no Conselho de Relações Islâmico-Americanas, já chegou a dizer que, caso houvesse oposição por parte dos coptas, eles "seriam varridos da face da terra".

domingo, 14 de abril de 2013

Raízes do sectarismo no Egito

Precisa de legenda?

Existe uma palavra no idioma russo chamada Pogrom. Ela se traduz, em linhas gerais, a algo como "destruir inteiramente". O vocábulo ganhou destaque internacional quando, entre 1881 e 1884, no sul da Rússia, os ataques contra a população judia se intensificaram (segundo consta foram até incentivados pela Okhrana). Um Pogrom é um ataque maciço e violento contra determinados grupos -geralmente religiosos- visando as pessoas e seus ambientes. Ataques como este vêm acontecendo no Egito há muito contra os cristãos coptas -que compõem 10% da população- mas não ganham grande destaque na mídia.

A mais recente escalada de violência se deu no início deste mês, quando quatro cristãos e um muçulmano morreram após confrontos na cidade de Al-Khasous. Os enfrentamentos ficaram mais intensos justamente no velório dos coptas, quando a Catedral de São Marcos foi atacada por vários manifestantes. Segundo fiéis cristãos, a polícia, ao invés de tentar apaziguar a situação, atirava gás lacrimogênio contra a Catedral. "A polícia está atirando gás em nós, eles estão tomando parte daqueles que nos atacam", relatou um jovem citado pelo Ahram (1).

Uma reunião foi realizada às pressas em Al-Khasous visando uma reconciliação entre muçulmanos e coptas. Estes últimos, representados pelo Conselho Consultivo da Organização Copta, fizeram fortes reivindicações e acusaram expressamente a polícia de tomar parte nos ataques. "O plano de luta sectária foi coroado pelas agressões por parte das forças de segurança na Catedral de São Marcos", rezava um trecho do comunicado. Ademais, exigiu-se uma retratação da posição tomada pelo Ministério do Interior dias antes, que condenava expressamente os cristãos pelo tumulto em Al-Khasous. Até o momento nada foi decidido (2).

Comprovando que ocorre justamente o contrário do proclamado pelo Ministério do Interior, o bispo Dom Rafael orientou seus fiéis a se manterem firmes: "Vocês só podem honrar os mártires ficando calmos e orando por eles" e ainda acrescentou que "esta ferida profunda me deixa com três mensagens. Uma para o céu...nós acreditamos na justiça divina...Cristo nos ensinou que ele vinga o sangue dos mártires e que eles não são esquecidos por Deus.

"Minha segunda mensagem é dirigida ao Egito: nós não vamos sair. Os governos não podem exercer seu poder através do derramamento de sangue. Minha última mensagem é dirigida aos coptas do Egito: nós não devemos abandonar nossa fé. O derramamento de sangue só nos deve fazer abraçá-la ainda mais!"

A segunda mensagem, que começa com "nós não vamos sair", sugere  o intuito dos ataques muçulmanos: a expulsão da população copta. Mas por que? Quando esta violência sectária começou? Quando muçulmanos e coptas chegaram ao Egito? Algum dos grupos têm mais direitos que o outro? Estas perguntas serão respondidas no próximo tópico.

O início das hostilidades

Em meu ensaio, cujo mote era a Primavera Árabe, intitulado "Os rumos da revolução" comentei sobre a partir de quando o Egito passou a ser dominado efetivamente por muçulmanos:

"Basicamente o Egito foi dominado desde 1805 até o início da década de 1950 pela dinastia Muhammad Ali. Esta iniciou-se com Muhammad Ali Pasha, comandante albanês do Império Otomano que seria encarregado de forçar a retirada das tropas francesas da região. Após fazê-lo, decidiu ficar a formar para si um protetorado que, com o tempo, tornou-se mais próspero economicamente que o próprio Império Otomano, abrangendo também o Sudão. Em meados de 1880 deu-se o domínio britânico, mas a dinastia Muhammad Ali seguiu no poder, sem qualquer oposição ao subjugo da Grã-Bretanha".

O excelente Egypt Independent (3) trouxe uma cronologia completa da violência sectária contra cristãos, enfatizando que ela se intensificou após o golpe militar que, em 1952, destituiu a monarquia. Antes disso, o episódio que ganhou maior destaque foi o assassinato do primeiro-ministro copta Boutros Ghali Pasha*, acusado de favorecer o imperialismo britânico. Ademais, ele -pese o fato de ser copta- foi nomeado chefe de uma comissão seletiva de juízes para o tribunal da Sharía. Nem é preciso dizer o quão desgostosos ficaram os muçulmanos.

Passada a monarquia e o golpe militar, o general Mohamed Naguib assumiu o poder (1952). Promovendo ampla abertura tanto política quanto econômica ele não agradou e foi substituído por Gamal Abdel Nasser. Sobre Nasser também escrevi algumas palavras anteriormente:
"(...) outro militar forte e idealizador da revolução, o coronel Gamal Abdel Nasser, não estava contente com a perspectiva de que conservadores religiosos - Irmandade Muçulmana- chegassem ao poder. A partir daí começou uma disputa entre Nasser e Naguib, sendo vencida pelo primeiro que instaurou uma ditadura nacionalista no país. Apesar do acordo de armas com a Checoslováquia e do financiamento soviético, Nasser nunca se declarou  pró-URSS. Seu lobby estava entre os não-alinhados e seu "carro-chefe" era o pan-arabismo. Dentro do Egito, ele perseguiu seus opositores (até mandou matar os que tentaram assassiná-lo pouco antes de ele assumir o poder) e deixou a democracia apenas para alguns discursos. Na prática, nada".
Sobre o governo Nasser, Tarek Osman, do Ahram, ponderou aspectos interessantes. Segundo o colunista, o general inicialmente teve o apoio dos coptas, que compunham boa parte da elite econômica desde a monarquia. No entanto, suas medidas populistas representadas pelo supracitado Pan-Arabismo e grande simpatia pela URSS afastaram os coptas mais ricos para os Estados Unidos e Europa. E isso fatalmente refletiu na derrocada da proteção dos cristãos, cujos principais defensores já não mais se encontravam no país (4).

O general Nasser morreu em 1970, vítima de um infarto. Anwar Al-Sadat, vice-presidente, assumiu o governo:
"Muitos viam Sadat como um político fraco e manipulável, mas ele mostrou o contrário. Utilizou-se de inúmeras estratégias que o mantiveram no poder e procurou um distanciamento das políticas ditatoriais de seu antecessor: incentivou os movimentos islamistas tirando a Irmandade Muçulmana da clandestinidade; promoveu uma aproximação com o Ocidente; e, no âmbito econômico, instaurou a Infitah, que foi a abertura do Egito para investimentos externos e privados".
 Sadat, após a surra que seus aliados estavam tomando de Israel, decidiu pôr fim aos conflitos e, em 1979, assinou o "Tratado de paz egípcio-israelense". Apesar da popularidade externa nos anos finais de seu mandato, Sadat estava sendo pressionado internamente. A Irmandade Muçulmana ganhou cada vez mais força até que o presidente a reconheceu legalmente (coisa que Nasser nunca fez). A entidade foi fundada em 1928 por Hassan Al-Banna e sempre contou com um forte diálogo anti-semita e fascista. Durante a Segunda Guerra Mundial foi financiada pela Alemanha Nazista.

Como o respeitado historiados norueguês Brynjar Lia contou em seu relatório sobre a Irmandade Muçulmana, "documentos apreendidos no apartamento de Wilhelm Stellbogen, diretor da agência de notícias alemã no Cairo, mostram que antes de 1939, a Irmandade Muçulmana recebeu subsídios financeiros da delegação alemã no Cairo. Stellbogen foi fundamental na transferência desses fundos" (5).

Para bom entendedor meia palavra basta. Quando Sadat chegou ao governo a força política da Irmandade já era imensa e não poderia mais ser desprezada. Qualquer garoto do colegial sabe que um movimento político precisa, antes de ter condições de exercer qualquer influência, passar por um período de maturação. Assim foi com a Irmandade Muçulmana. Aos desavisados que suspeitam uma fuga do assunto por parte do escritor, fica um aviso: aumento do poderio da Irmandade significa maior supressão dos cristãos coptas. Ao passo que a entidade muçulmana se fortalecia, ocupava os espaços antes dominados pelos cristãos. Esta tática os lembra alguma coisa?

Governo Mubarak

Anwar Al-Sadat foi assassinado em 1981:
"Em 1981, durante uma parada em carro aberto no Cairo, ele foi assassinado. O comandante do grupo executor, Khalid Islambouli, foi condenado a morte um ano depois. Para muitos, Hosni Mubarak teve participação ativa no golpe, não só por ter saído ileso como também pelas inúmeras "coincidências" que se deram no momento: a inatividade dos seguranças presidenciais e caças passando sobre o presidente no exato instante que os tiros foram disparados".
Com Hosni Mubarak no poder houve uma falsa sensação de segurança entre muçulmanos e cristãos. O ditador, mesmo sabendo a força da Irmandade Muçulmana, voltou a torná-la ilegal e organizou uma censura para seus meios de comunicação. Quem estava de fora pensou que a militância fora desbaratada. Contudo, o oposto acontecia e seu crescimento gradativo não foi interrompido. O que Mubarak fez foi evitar, por meio da força, que distintos grupos tivessem contato dentro do Egito. Liberais, coptas e muçulmanos viveram separados até o levante que derrubou o ditador.

Primavera Árabe

É unanimidade entre os especialistas que a revolta egípcia foi de cunho espontâneo. Apesar do exemplo da Tunísia, Mubarak acreditava que poderia coibir os manifestantes. Foi assim durante muitos meses. Fazendo uma reflexão mais profunda, nem mesmo a Irmandade acreditava na queda do ditador. Elucido meu argumento com a frase que tanto vinculou nos meios de comunicação egípcios: "a Irmandade foi a última a entrar na Praça Tahrir e a primeira a sair".

Os membros da Fraternidade só entraram de vez na revolução quando tiveram absoluta certeza da derrota de Mubarak. Ao cabo de tudo, para os que acreditavam que ela havia sido suficientemente reprimida no governo Mubarak, Mohamed Morsi, um proeminente membro, foi eleito presidente na primeira eleição democrática da história do Egito.

Os motivos para a eleição de Morsi foram mencionados em todos os parágrafos acima. Se faz mister destacar agora a situação dos coptas, que é claramente insustentável. Com um presidente da Irmandade Muçulmana, entidade de cunho fascista que persegue desde seu início cristãos e judeus, o que pode ser feito? Sua esperanças estariam depositadas na oposição, caso nesta não imperasse o caos. A suposta "organização" Frente da Salvação Nacional apenas engloba todos aqueles que se dizem contra o governo, mesmo sem ter uma agenda fixa e planos para fazer frente ao trabalho da Irmandade.

O grupo militante muçulmano esperou 84 anos para assumir o poder e dificilmente sairá de lá. Enquanto isso, a perseguição aos coptas não irá cessar até que tais "forças" de oposição tenham em mente que este é um dos objetivos criminosos da Irmandade e que precisa claramente ser coibido antes que mais pessoas inocentes morram unicamente por expressarem a sua fé.



(1). Politically charged Coptic funeral ends in violence, one Death. Al-Ahram
(2). Seventh death in Al-Khousous. Daily News Egypt.
(3). Roots of religious violence lie booth state and society. Egypt Independent.
(4). Understending sectarianism in Egypt. Al-Ahram.
(5). Fascismo islâmico: a conexão Nazista. Gary Aminoff.
FOTO: The Jewish Press.

*Alguns devem estar se perguntando sobre a palavra "Pasha" (pronuncia-se "paxá" em português) acrescentada após os nomes de Muhammad Ali e Boutros Ghali. Ela não designa um sobrenome, mas sim uma alta honraria. Era muito comum tanto no Império Otomano quanto na monarquia egípcia. Alguns autores colocam como a equivalência muçulmana ao título de cavaleiro na Grã-Bretanha. Boutros Ghali foi o primeiro copta a receber tal honra no Egito

segunda-feira, 18 de março de 2013

"Cada resposta resulta em uma nova pergunta"

Yair Lapid e Naftali Bennett.

Este é um conhecido provérbio iídiche que pode ser usado para explicar a coalizão do governo de Israel capitaneada por Benjamin Netanyahu. Na passada semana, após 33 longos dias de negociação, as partes finalmente chegaram a um acordo. Além do Hatnuah, Yesh Atid e Habayit Hayehudi passaram a compor o governo que tem maioria no Knesset. Pese o fato de ser apenas o primeiro passo da caminhada, muitas dúvidas já pairam sobre as cabeças dos israelenses.

Primeiramente é importante ressaltar o por que de tamanha demora para compor o governo. Dois motivos nos saltam à vista: (1) Netanyahu foi displicente e, ao contrário do que se acreditava, não procurou Naftali Bennett prontamente. Seu alvo inicial, na verdade, foi Yair Lapid, que à esta altura tinha um plano bem arquitetado e, propositalmente, recusou. (2) Passaram-se os dias e Netayahu conseguiu apenas o apoio de Tzipi Livni (que no final das contas ficará com o Ministério da Justiça). Nisso, Lapid conseguiu colocar seu plano em prática e formou uma forte aliança com Naftali Bennett. Esta aliança exigia de Netanyahu ministérios-chave, caso aderissem à coalizão, e também a exclusão de partidos haredi, como por exemplo, o Shas (parceiro de longa data do Likud).

A coligação entre o segundo e o terceiro partidos mais votados das eleições merece ser vista com bastante cuidado. Na opinião de alguns ela significou uma "traição" de Bennett a seus eleitores, haja vista que ele seria uma alternativa ao Likud não se distanciando muito do mesmo. Pudemos ver, ainda durante a campanha, cartazes do Habayit Hayehudi contendo as fotos de Bennett e do premiê. Isso agravou muito a posição do ex-membro do Likud quando da associação com Lapid. No entanto, é preciso se levar em consideração a detachment de Netanyahu anteriormente mencionada.

Enquanto isso, quem ganhava ainda mais prestígio era Lapid. Com Bennett a seu lado ele exigia mais veementemente a cadeira das Relações Exteriores, ocupada por Avigdor Lieberman antes do escândalo de corrupção que ainda não foi julgado. Netanyahu, como esperado, protegia o cargo (coisa que conseguiu fazer até o fim).

Mas a posição quase irredutível de Yesh Atid e Habayit Hayehudi não foi o único problema. Muito se falou sobre o tema dos ultra-ortodoxos, que estão isentos do serviço militar e são subsidiados pelo governo para continuarem seus estudos das sagradas escrituras. Uma das bandeiras de Lapid e Bennett era justamente o fim de tal regalia. Por isso os dois não queriam fazer parte de qualquer coalizão que contivesse o Shas.

Ao cabo de tudo eles bateram o pé e atingiram seus objetivos. Segundo a imprensa israelense os últimos dias de negociação foram exaltados, com Bennett precisando ser "o adulto de plantão" para mediar o diálogo de Netanyahu e Lapid. Na quinta-feira (14) foi anunciada a nova coalizão(ainda que o acordo não estivesse sacramentado). Mesmo tendo parceiros que não são de seu agrado, o premiê se manterá à frente do governo. Lapid "se contentou" com o Ministério das Finanças, enquanto Bennett guiará o do Comércio. Sou dos que defendem o primeiro na cadeira de Relações Exteriores, mas Netanyahu não iria deixar de cumprir sua palavra dada a Lieberman.

As mudanças que veremos prontamente (digamos dentro de 45 dias, que é prazo mínimo estipulado para que as primeiras leis cheguem até o Knesset) envolverão setores religiosos (incluindo os ultra-ortodoxos), questões políticas, educação e uma pequena reforma ministerial. Falando sobre os haredim, eles deveriam se juntar ao serviço militar com a idade de 21 anos. Caso contrário, alguns benefícios seriam cortados, como por exemplo, a segurança social. Até o momento a possibilidade de processo para os que não se apresentarem de qualquer maneira não é cogitada.

No âmbito religioso, envolvendo as negociações com Bennett, ficou acordado que instituições religiosas teriam seu status regulamentado por lei e que receberiam financiamento especial. O Ministério de Serviços Religiosos, além de dirigido pelo Habayit Hayehudi, incluiria o controle de locais sagrados e do Rabinato Chefe (que estão atualmente nas mãos dos haredim). O governo, ademais, apresentará uma lei no Knesset para definir Israel claramente como um Estado judeu. Tal norma se enquadraria como "Lei Básica", sendo necessária uma maioria especial no Parlamento israelense para confirmar ou revogá-la (se assemelha às Emendas Constitucionais no Brasil no que tange o processo de aprovação).

Chegar a um consenso com Lapid também não foi tarefa das mais simples. Ele exigiu, além do Ministério das Finanças, encabeçar o comitê ministerial encarregado dos encargos sociais. Na área da educação, cujo ministro será Shai Piron (número 2 do Yesh Atid) a ideia é implantar, dentro de seis meses, os estudos fundamentais obrigatórios para absolutamente todos os estudantes, incluindo os haredim. Last but no least, no que tange a política, a nova lei aceitará que partidos que tenham conseguido no mínimo 4% dos votos tenham acesso a cadeiras no Knesset (até o momento o mínimo é de 2%) e reduzirá o número de ministérios de 22 para 18¹.

Estes, meus caros, foram apenas os primeiros problemas enfrentados pelos novos parceiros de governo. Assim que o mandato começar oficialmente mais divergências aparecerão (esperem também pelo retorno de Avigdor Lieberman). Uma destas, como coloca bem o Times of Israel, é a questão dos assentamentos na Cisjordânia: Livni quer acelerar as negociações de paz com os palestinos enquanto Uri Ariel, Ministro da Habitação, é um defensor da expansão dos assentamentos; a aposta do Yesh Atid é que acabar com o governo tendo responsabilidades para com os palestinos, dando-lhes autonomia, enquanto Bennett pretende anexar a maior parte da Cisjordânia².

Por fim, o Ministério da Defesa ficará a cargo de Moshe Ya'alon, ex-chefe do Estado-Maior israelense. Ya'alon, de 62 anos, tem uma longa a prestigiosa carreira militar. Depois da guerra dom Yom Kippur, onde esteve entre os primeiros a atravessar o Canal de Suez, permaneceu no IDF tornando-se mais tarde chefe da unidade de elite Sayeret Matkal. Foi um dos maiores críticos da retirada unilateral da Faixa de Gaza em 2005 (quando Ariel Sharon era primeiro-ministro). Se juntou ao Likud em 2008. Para alívio de Netanyahu, suas posições sobre o Irã são parecidas (ainda que aparentemente mais moderadas)³.

¹ Coalition guidelines to chance Israel's religious status quo. Israel Hayom
² Netanyahu and his partner-rivals. Times of Israel
³ "I'm determined to lead responsibly", new defense chief says. Israel Hayom