sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Há um futuro?

Yair Lapid.

No dia 7 de janeiro falei sobre os muitos partidos que disputariam as eleições parlamentares israelenses e as possíveis coalizões capitaneadas por Netanyanu. Nesta semana o povo foi às urnas e deu, como esperado a vitória ao Likud-Beytenu. No entanto, o sabor desta vitória foi um tanto amargo, haja vista que o partido ficou com 31 assentos no Knesset (perdeu 11).

A verdade é que o grande vencedor das eleições foi o centrista Yesh Atid, partido do ex-âncora e jornalista Yair Lapid. O partido, que em português seria traduzido como "há um futuro", conseguiu nada menos do que 19 cadeiras, número muito acima do esperado (as pesquisas indicavam 11 ou 12 no máximo). E com 11 ficou justamente o Habayt Hayehudi, partido ultranacionalista liderado por Naftali Bennett, ex-membro do Likud que deixou a legenda por problemas com Netanyahu (e com sua esposa Sarah). Também com 11 ficou o haredim sefardita Shas, velho parceiro do premiê. O Trabalho, de Shelly Yachimovich, alcançou o número de 15 cadeiras e novamente deve ficar à frente da oposição.

Muitos analistas dizem por aí que Israel "deu uma guinada perigosa para a direita". Eu discordo. E acredito que o número de assentos conquistados pelo Yesh Atid prova isso. Mas então porque estão falando desta migração para a direita? Tudo começou da fusão do Likud com o Yisrael Beytenu de Avigdor Lieberman. Esta era uma estratégia de Netanyahu que visava justamente polarizar a política israelense. Ele queria basicamente o seguinte: seu bloco representava uma defesa forte em tempos turbulentos enquanto o outro se mostraria fraco para proteger o país. Isso, em tempos de Primavera Árabe e com a constante ameaça do Irã, poderia fazer -e fez- a diferença.

Não obstante, Netanyahu procurou se aproximar ainda mais dos haredim pela questão do serviço militar. Para quem não sabe, em Israel muitos judeus ultraortodoxos não trabalham e estão isentos do serviço militar (que no país é obrigatório) para se dedicarem inteiramente aos estudos sagrados, o que gera muita polêmica. Partidos como o Shas representam os ultraortodoxos e, se o chanceler os deixasse escapar, poderiam ir para a oposição.

Esta foi, digamos, uma estratégia de campanha. Talvez mais do que de governo. Temos de convir que Benjamin Netanyahu -apelidado pela Time de "Rei Bibi"- não é o governante mais simpático do mundo. E realmente não é. Mas ele também não é um político de extrema-direita como dizem por aí. O que aconteceu foi que, com a mencionada estratégia de campanha, a legenda Likud-Beytenu se tornou mais conservadora e espantou alguns eleitores moderados. O plano de Arthur Finkelstein, conhecido estrategista americano, era que o partido tivesse mais ganhos do que perdas. Ou seja, ele não previu os 31 assentos no Knesset.

O resultado da "minuciosa" estratégia foi um só: o Likud-Beytenu migrou para a direita e os eleitores moderados para o centro. E este centro era representado pelo Yesh Atid. No final das contas Lieberman e Netanyahu precisarão fazer algumas concessões e se esforçarão ao máximo para ter Yair Lapid ao seu lado. David Weinberg, comentando sobre a fusão Likud-Beytenu no ano passado, disse que um dos objetivos era "minar" o centro, posto que o Kadima não vive seus melhores momentos (nestas eleições ficou com apenas 2 cadeiras).

De momento, Benjamin Netanyahu entrou em contato com todos os partidos para formar a sua -frágil- coalizão. O principal parceiro precisa mesmo ser Lapid. O problema é que uma das bandeiras do Yesh Atid era o serviço militar obrigatório também para os ultraortodoxos (além de questões sociais e econômicas, que pouco foram abordadas pelo premiê na campanha). A reação inicial do Shas foi até positiva -pelo menos segundo o Israel Hayom. O partido anunciou que aceitaria compor um governo juntamente com o Yesh Atid. Este, por sua vez, também precisará abrir mão de determinadas ideias ou, digamos, adiá-las. O mesmo Israel Hayom indicou que a determinação de incluir os ultraortodoxos no serviço militar pode ser "prorrogada".

Tudo levar a crer que Yair Lapid quer o cargo de ministro das relações exteriores. O problema é que Avigdor Lieberman quer se manter nele. Cá entre nós, para Israel seria muito melhor ter Lapid na posição, mas não será nada fácil para o chanceler jogar o chefe do Yisrael Beytenu de lado. E ele não deve fazê-lo. Lapid, se quiser, precisará "se contentar" com o ministério das finanças.

Acreditem se quiser, mas será mais fácil para Bibi conseguir o apoio do Yesh Atid do que do Habayt Hayehudi. Como falei acima, Naftali Bennett abandonou o Likud por divergências com Netanyahu e, ainda que ele tenha deixado em aberto a possibilidade de apoiar o ex-chefe, as diferenças entre os dois podem atrapalhar (fala-se que a senhora Sarah Netanyahu não ficaria muito contente com a parceria. Papo de tabloide).

Mas e quanto à Palestina? Meus caros, nada deve mudar. Netanyahu não é o melhor negociador do mundo e Mahmoud Abbas tampouco. Portanto, veremos mais do mesmo. Outra coisa que não deve mudar é a instabilidade do governo. Uma unanimidade entre os especialistas (pró e anti-Bibi) é que novas eleições não tardarão muito a acontecer. Dadas as circunstâncias, não tem como discordar.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

O batismo de fogo de Al-Muthalimin

Mokhtar Belmokhtar.

Nesta quarta-feira um grupo de terroristas atacou uma indústria de gás em In Amenas, norte da Argélia fazendo reféns 41 estrangeiros, 300 argelinos e matando um argelino e um britânico. De momento, as informações que temos são que os reféns estão sendo libertados -pelo exército argelino- aos poucos e que seis deles (estrangeiros) morreram. A maior parte dos argelinos presos foram libertados pelos terroristas.

Segundo a agência de notícia NIA, da Mauritânia --que mantém contato constante com um suposto porta-voz do grupo-- este ataque aconteceu como forma de retaliação a Argélia, que permitiu que aviões franceses entrassem em seu espaço aéreo visando chegar a Mali e combater os jihadistas que tomaram o norte do país há quase um ano.

No entanto, uma fonte da CNN disse que o ataque foi preciso demais para ter sido planejado em tão poucos dias (a França mandou tropas a Mali apenas na semana passada). Assim sendo, especula-se que seja mais um ato de afirmação do Al-Muthalimin (em árabe, "os que assinam com seu sangue"), um grupo terrorista comandado por Mokhtar Belmokhtar, ex-membro da fragmentada AQMI (Al-Qaeda no Magreb Islâmico).

Para entender o que está acontecendo, precisamos refletir com calma a respeito de tudo que gira em torno do grupo e, sobretudo, de seu líder. Belmokhtar nasceu no sul da Argélia e, quando adolescente, combateu no Afeganistão, onde perdeu um olho e ganhou o apelido de Belaouar (um olho só). Também no Afeganistão ele disse que chegou a conhecer e a treinar com ninguém menos que Osama Bin Laden.

Voltando à Argélia, ele integrou o Grupo Islâmico Armado (GIA), precursor da AQMI. Mas não foi tudo tão simples assim. Na época, para se firmar e ganhar mais força, a entidade terrorista realizou ataques e sequestros violentos e valeu-se também de contrabando de armas e drogas (nisso, Belmokhtar ganhou seu segundo apelido, o de "Mr.Marlboro"). Um dos principais encarregados de tais atividades era justamente Belmokhtar, tido como um dos mais violentos membros da AQMI.

O francês Jean-Pierre Filiu, especialista na AQMI, disse que Belmokhtar, apesar de fazer parte do grupo, agia por conta própria e não gostava muito de receber ordens. O francês ainda afirmou que Abdelmalik Drukdal, líder global da organização, o rebaixou de sua posição como "Emir no Sahel". Alguns sites disseram que ele foi expulso da entidade, mas provavelmente se confundiram e citaram este rebaixamento como uma expulsão. Ao que parece, Belmokhtar criou uma ferranha rivalidade com Abou Zeid, outro sanguinário -porém influente- membro da AQMI. Segundo Filiu estas diferentes "vertentes" que culminam em rivalidades são comuns no grupo.

Belmokhtar, segundo a CNN, também ofereceu seu "apoio" a grupos jihadistas na Líbia. Até o fim do ano passado ele estava em Mali. E foi justamente sua presença no país que ratificou a ligação do Movimento pela Unidade da Jihad na África Ocidental (MUJAO) e do Ansar Al-Dine (Defensores da Fé) com a AQMI

Em uma declaração, ele disse que queria libertar "companheiros" presos pelo governo argelino. Ainda que estejamos em fase de especulação sobre o grupo, dá a entender que ele queira provar seu valor por intermédio deste ataque e, principalmente, conservar a autonomia da qual nunca abriu mão. O mais assustador é que, com o Al-Muthalimin, a esfera de influência da AQMI só aumenta.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Apesar das complicações, Netanyahu deve vencer

Lieberman e Netanyahu.

Há poucos dias no twitter comentei sobre a quantidade de partidos que se plantearam a disputar as eleições parlamentares israelenses e o quanto era difícil lembrar de todos os nomes. Realmente tal tarefa não é das mais fáceis. Contudo, o bloco liderado por Benjamin Netanyahu -atual premiê- e Avigdor Lieberman deve ganhar o maior número de assentos no Knesset (Parlamento israelense) e formar um novo governo.

Assim que dissolveu o Knesset, Benjamin Netanyahu anunciou que estava formando um novo bloco. Este, seria com o partido Yisrael Beytenu, do ministro das relações exteriores Avigdor Lieberman. A nova coligação, Likud-Beytenu, visava angariar um maior número de assentos e ter menos dificuldades para compor um governo de coalizão. O preço que Netanyahu pagou foi perder alguns de seus "fiéis" companheiros ultra-ortodoxos. Aparentemente isso não geraria muitos problemas, no entanto a situação mudou um pouco como mencionarei mais adiante.

Por enquanto as pesquisas indicam que o Likud-Beytenu tem 28,2% das intenções de votos, número que o deixa com cerca de 34 cadeiras no parlamento. Este é composto por 120 membros, ou seja, um governo estável precisa ter o apoio de ao menos 61 parlamentares. Aí é que entram os possíveis acordos que Netanyahu e Lieberman precisam fazer.

Para o colunista Noam Sheizaf, as primeiras opções de coalizão são Bayit Yehudi Shas. O primeiro representa o movimento dos colonos, que ganha cada vez mais força entre o eleitorado. O Shas, por sua vez, é um dos velhos parceiros ultra-ortodoxos do Likud e a única chance de abandonar uma possível coalizão com o partido do premiê é se o centrista Kadima (liderado por Shaul Mofaz e apoiado por Ehud Olmert) entrar no meio. Isso é possível, mas não muito provável.

A dúvida fica acerca do Yesh Atid, partido centrista que foi criado pelo ex-âncora do Canal 2 Yair Lapid. Digamos que ele está flertando com os dois possíveis governos: o provável capitaneado pelo Likud-Beytenu e o improvável liderado pelo Partido Trabalhista. Nesta semana ele se reuniu com os trabalhistas, liderados por Shelly Yachimovich, e o Hatnuah, novo partido de centro-esquerda criado por Tzipi Livni. Mas, para falar a verdade, desta reunião não surtiu efeito algum.

Vendo que nas últimas semanas a popularidade do Likud-Beytenu estava caindo -devido aos escândalos que envolvem Avigdor Lieberman- Yachimovic declarou que não formaria coalizão com o partido e que, em caso de vitória, lideraria a oposição. Livni inicialmente se mostrou mais maleável mas logo se aproximou de Yachimovich. Ela disse que só se juntaria a Netanyahu se algum outro partido de centro-esquerda também o fizesse. As pequisas indicam que os dois partidos juntos teriam cerca de 28 assentos.

Para alguns analistas Yachimovich pode tentar formar uma aliança com aqueles que deixaram Netanyahu após a aproximação com o Yisrael Beytenu e outros partidos de esquerda, como Meretz e os árabes. A verdade é que tal combinação só resultaria perigosa para Netanyahu caso Yesh Atid e Hatnuah aderissem. Contudo, em uma só manobra o primeiro-ministro pode contornar a situação. Explico: ambos deixaram sua participação ou não na coalizão capitaneada por Likud-Beytenu em aberto, certo? Pois então, Netanyahu pode chamar os dois. Isso o faria perder o Shas, mas seguiria com mais cadeiras no Knesset.

Estas são as teorias mais plausíveis e nas quais acreditam a maioria dos especialistas. Um dos que discordam é David Weinberg, do Israeal Hayom. Vale lembrar que ele acertou a maioria de suas previsões para 2012. Em suas palavras, "Netanyahu terá dificuldades com suas próprias alianças, e seu novo amplo governo de coalizão não vai durar muito tempo também. Nós vamos ter eleições novamente dentro de dois anos."

Weinberg ainda aposta que Yachimovich, apesar de negar veementemente, fará parte do governo: "Depois de flertar com a direita para a campanha eleitoral, Netanyahu volta para o centro visando elaborar uma coalizão. Para melhorar sua respeitabilidade internacional ele sacou Ehud Barak e Avi Ditcher. Ele vai cooptar Yachimovich e Lapid para o governo com ele (apesar dos protestos de Yachimovich), mas não Livni."

Para falar a verdade, Weinberg só complicou ainda mais as coisas. Veremos no que isso vai dar quando, no próximo dia 22, as eleições finalmente forem realizadas. A única certeza que temos no momento é que o próximo governo vai ter muito trabalho para se manter em pé.