segunda-feira, 24 de junho de 2013

Qusayr caiu e levou consigo a moral dos rebeldes

Após 17 longos dias de batalha  Qusayr sucumbiu às forças de Bashar Al-Assad e do Hezbollah na quarta-feira (5), naquela que foi uma das derrotas mais duras para os insurgentes sírios. A cidade, que estava há cerca de um ano nas mãos dos rebeldes, servia como rota de abastecimento para suas tropas com suprimentos vindos do Líbano.

Qusayr localiza-se ao norte da fronteira com o Líbano e está próxima ao Vale do Bekaa. Era uma das poucas cidades do centro-sul da Síria que ainda estava sob o jugo dos rebeldes. Assim sendo, a mobilidade de tropas vindas do norte não foi uma surpresa. Para Assad o comando da cidade seria vital por três grandes motivos: (a) cortar a principal rota de abastecimento rebelde provinda do Líbano; (b) "limpar" o corredor que liga Damasco a Tartus e Latakia, cidades do noroeste sírio que são redutos da seita alauíta do presidente e que albergam grande parte de seus apoiadores (vale lembrar também que em Tartus está uma instalação estratégica naval russa); e (c) propiciar uma válvula de escape para que suas tropas tenham acesso também a Homs e de lá para outras áreas ao norte.

Reparem no corredor formado à esquerda.

A vital contribuição do Hezbollah

No mês passado o líder do grupo terrorista libanês Hezbollah, Sheikh Sayyed Hassan Nasrallah, gravou uma mensagem na qual deixava extremamente claro que apoiaria seu parceiro Bashar Al-Assad até as últimas consequências prometendo o envio de "dezenas de milhares de combatentes". Sua justificativa foi que o fluxo de estrangeiros nas fileiras rebeldes aumentou muito nos últimos tempos. E quanto a isso ele tem razão. O Syrian Human Rights Watch estima que 2.219 estrangeiros foram mortos lutando em nome dos rebeldes.

No entanto, o envio de militantes à Síria serviu também como uma espécie de laboratório para os terroristas xiitas. De 2006 para cá suas técnicas de treinamento foram modificas enfocando sobretudo táticas de guerrilha. Isso porque, segundo a própria liderança do grupo, tais artimanhas poderiam ser eventualmente utilizadas contra o "agente sionista".

A estratégia de guerrilha difere um pouco do antigo modus operandi do Hezbollah: nos anos de 1990 a luta ocorreu (contra israelenses) principalmente em territórios rurais, onde os milicianos precisaram aprender a se camuflar em um ambiente difícil de floresta densa; em 2006 os confrontos passaram a acontecer dentro de vilas e cidades, o que propiciou um aperfeiçoamento nas táticas de guerrilha (táticas estas que foram aprimoradas no Irã).

Qusayr era acessível para o Hezbollah.

Inicialmente, segundo Nasrallah, a constante movimentação de milicianos do grupo terrorista na região era apenas para "proteger civis libaneses". Mas logo que se viu que o objetivo era bem maior do que esse. No exato momento em que o exército de Assad começou a perder terreno em Homs, tropas mobilizadas em Hermel e no Vale do Bekaa foram prontamente acionadas para o apoio. O mesmo ocorreu em Qusayr.

No entanto, nesta última pudemos ter uma real dimensão do envolvimento dos terroristas xiitas e do quanto suas táticas recém-aprimoradas podem oferecer grande perigo a Israel futuramente. Citando um miliciano de nome Hajj Abbas, o jornal Daily Star forneceu mais detalhes sobre a batalha. O principal deles foi a efetividade do Hezbollah no confronto: o grupo terrorista utilizou cerca de 1.200 combatentes de suas forças de elite e comandou os ataques do solo, enquanto o exército de Assad ofereceu apoio aéreo. Engenheiros também foram mobilizados para, nas palavras do terrorista ao Daily Star, livrá-los de "maiores dores de cabeça" que poderiam ser acarretadas pelas armadilhas dos rebeldes.

A queda de Qusayr era uma questão de tempo.

Os rebeldes que lá estavam receberam reforços das brigadas Farouq, Al-Haqq, Mughaweer, Wadi, dos batalhões Quassion  e Ayman. Sobre o Jabaht Al-Nusra, poucos foram os que apareceram. Aproveitando a "fama" do grupo a mídia quis exagerar um pouco. De qualquer forma nem todo este deslocamento bastou para  que a cidade fosse mantida sob o jugo rebelde. A resistência foi brava, sem dúvidas, e eu diria até milagrosa. Mas contra milicianos bem preparados e que ainda contavam com grande auxílio do exército regular, seria impossível permanecer no comando de Qusayr.

Resultados políticos da batalha de Qusayr

Se a fragmentação do suposto Exército Sírio Livre (FSA na sua sigla em inglês) já era um motivo para a divisão política*, agora tudo ficará ainda mais complicado. Ainda que tenha perdido muitas cidades ao norte, a vitória sobre Qusayr foi uma das mais significativas até agora nesta guerra civil para Bashar Al-Assad.

Estamos no aguardo de uma nova reunião que resultará nas discussões de sempre sobre a saída imediata ou permanência de Assad, sua participação em um novo governo, etc. Enquanto isso, é bom lembrar que "oficialmente" o número de mortos já ultrapassa os 80 mil (para o SHRW estamos na casa dos 94 mil). E impasses nas negociações só irão gerar mais e mais mortos.

Outra consequência imediata da vitória de Assad com o apoio do Hezbollah é uma tendência ao aumento no número de combatentes estrangeiros pelo FSA (muitos deles jihadistas). É importante lembrar que o clérigo sunita do Qatar e pró-Irmandade Muçulmana, Sheikh Youssef Qaradawi, convocou todos os sunitas a lutarem contra Assad e contra o "Partido do Satã" (é assim que ele chama o Hezbollah, cujo nome significa "Partido de Allah").

*Com o passar do tempo e o aumento nas dificuldades para os rebeldes, a oposição fica cada vez mais dividada também no campo ideológico. Até o momento aqueles que, para os insurgentes, estão apresentando resultados são os extremistas islâmicos. Prova disso é o Jabaht Al-Nusra. Ademais, a Irmande Muçulmana também cresce exponencialmente dentro da oposição. Logo que Ghassan Hitto foi eleito PM interino da Coalizão Nacional Síria, o clérigo Moaz Al-Khatib (figura muito respeitada no Ocidente) renunciou.

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