sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Grexit foi momentaneamente adiada mas ainda pode ocorrer

Antonis Samaras e Angela Merkel.

Depois que novas eleições legislativas foram realizadas na Grécia e o partido de centro-direita Nova Democracia conseguiu o maior número de assentos, seu líder, Antonis Samaras, sofreu para formar um governo de coalizão mas por fim conseguiu. Só lhe restava então enfrentar a crise de peito aberto e esforçar-se ao máximo para manter a Grécia na União Europeia.

No começo foi bastante difícil porque Fotis Kouvelis e Evangelos Venizelos, líderes do Dimar e do PASOK, respectivamente, não estavam de acordo com certas medidas de austeridade. Entretanto, Samaras pôs-se à frente de tudo e, contando com um ministro de finanças que ajudou a colocar a Grécia na UE há alguns anos (Yannis Stournaras), convenceu-os de que seria o melhor para o país.

Há poucos meses o primeiro ministro viajou para Bruxelas mas nada de importante aconteceu. O que marcou de verdade a Grécia desde o início do governo Samaras foi a chegada da troika -comissão formada por FMI, BCE e Comissão Europeia- cuja principal função é fiscalizar as possibilidades que a Grécia tem de cumprir ou não o acordo presente no memorando para que a segunda parcela do empréstimo de 130 bilhões de euros seja liberada.

Os primeiros dias foram de muito alarde na imprensa internacional com reflexo na bolsa de valores. A verdade é que muitos temiam uma pronta avaliação negativa dos chamados "homens de negro da troika". Mas foi aí que a figura de um Samaras com pulso firme começou a aparecer. Ele disse que a nação helênica faria o possível para cumprir o que foi acordado. Nas palavras do jornalista Alexis Papachelas, "Samaras não quer ver a Grécia regressar ao dracma, porque ele sabe que o custo, a pobreza e o desespero que se sentiria fariam a situação atual se tornar um 'passeio no parque'. Ele também se preocupa com o ônus de ser o governante no período de abandono da UE".

Seu plano de austeridade corresponde à uma economia de 11,5 bilhões de euros em um prazo de 2 anos. O país conseguiria isso através de cortes em aposentadorias (por enquanto apenas as pessoas que recebem menos de 700 euros mensais não sofreriam deduções), reduções de salários e privatizações. Entretanto, a outra parte da coalizão -Dimar e PASOK- não estão de pleno acordo com tais medidas (principalmente a primeira).

Prova disso foi que Fotis Kouvelis declarou que queria uma reunião com Jean-Claude Juncker, presidente do Eurogrupo, que viajou à Grécia. Ademais, segundo a edição em inglês do jornal Kathimerini, Evangelos Venizelos pretende "renovar" a política grega de centro-esquerda e para isso contará com a ajuda do Partido Verde da Grécia e também do Dimar. O encontro entre as cúpulas está previsto para o início de setembro, justamente quando o PASOK faz aniversário e a troika divulgará seu relatório. Momento crucial.

Em uma reunião com a chanceler alemã, Angela Merkel, Samaras pediu mais tempo para que a Grécia possa cumprir o acordo: "não estamos pedindo mais dinheiro, queremos apenas um pouco de tempo para respirar. O premiê também fez questão de ressaltar que o país já está trabalhando duro para acatar o memorando.

Merkel decidiu não se pronunciar a respeito do pedido. Suas declarações se limitaram a defender -modestamente- a permanência da Grécia na UE e enfatizar que é preciso esperar o parecer da troika antes de dar qualquer passo. Wolfgang Schäuble (seu ministro de finanças), em contrapartida, se opôs a ideia de Samaras dizendo que "tempo é dinheiro".

Para um país que estava à beira do caos político e econômico há pouco menos de dois meses atrás já podemos dizer que a Grécia respira (com a ajuda de aparelhos, mas respira). Contudo, é importante se ter em mente que este é apenas um obstáculo pelo qual o país que está no seu quinto ano de recessão (e deve atingir exorbitantes 7% em 2012) deve passar até poder finalmente ter um alento.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Paul Ryan será o companheiro de Mitt Romney na chapa republicana

Ryan e Romney.

No fim da última semana o candidato republicano à presidência dos Estados Unidos, Mitt Romney, finalmente anunciou o nome de seu vice. O escolhido foi o congressista Paul Ryan, de 42 anos, de Wisconsin. Esta escolha deixou ainda mais evidente a abordagem predominantemente econômica na campanha de Romney.

Mas antes de falar sobre o quesito economia, passemos a uma análise de Ryan. Por que Romney o escolheu? Basicamente nos últimos anos com suas propostas de reformulação fiscal -incluindo a interessante ideia de privatizar a previdência social- ele se mostrou como parte da nova geração do Partido Republicano. Geração esta que pretende mudar a cara do partido e literalmente "sair do muro". Outro que também faz parte desta geração é Marco Rubio, senador pela Flórida, que estava entre as opções de Romney.

Para mim a escolha de Rubio seria quase que unicamente uma aposta no voto dos hispanos. Pese o fato de pertencer à ala mais conservadora do partido, seu impacto nacional seria bem menor que o de Ryan. E, de uma forma ou de outra, Romney sabe que apenas um milagre lhe fará obter mais votos que Barack Obama na Flórida (seja de hispanos ou não).

Na tentativa de contrariar o já mencionado aqui pragmatismo em sua campanha, Romney escolheu um vice de retórica bastante afiada e, principalmente, alguém que é muito bem visto pelo Tea Party. Ao longo dos anos Ryan veio "enchendo os olhos" dos conservadores americanos e abrindo as mentes dos mais liberais. E isso não é muito comum.

Agora ele ficou mundialmente conhecido como o homem que quer derrubar o Medicare de Obama (mesmo tendo apoiado o projeto há alguns anos atrás) -o programa de saúde para quem tem mais de 65 anos. Na verdade, ele quer substituí-lo por um programa de pagamentos diretos aos idosos, que poderiam então comprar um seguro privado. Mas por que isso? Basicamente para cortar alguns dos (muitos) gastos estatais. O problema é que tal medida desagrada mesmo aos conservadores, como lembrou Caio Blinder: "A história mostra que a base republicana despreza gastos governamentais e o déficit fiscal em termos abstratos, mas a conversa muda quando programas específicos ameaçam os beneficiados. É fácil se insurgir com a percepção que o governo é muito camarada com gente pobre, mas é outra coisa ser convocado para oferecer sua dose pessoal de sacrifício".

Ainda que a reforma do Medicare esteja um pouco distante, o simples fato de Ryan defender um projeto desta magnitude já revela muito sobre ele. A campanha de Romney saiu do campo da crítica única e exclusivamente econômica para o campo das possíveis soluções, o que é uma grande coisa.

O fato de ele ser próximo do Tea Party não prejudica em nada o ex-governador de Massachusetts. Aliás, muito pelo contrário, isso só une ainda mais os republicanos. O American Conservative, inclusive relembrou os vice-presidentes republicanos que ao longo da história se mostraram mais conservadores que os próprios presidentes. Dentre eles estão Richard Nixon ( vice de Dwight Eisenhower), Spiro Agnew (vice do próprio Nixon e sim, ele era mais conservador que o Nixon!) e Dan Quayle (vice de George HW Bush).

O jornal ainda relembra a simpática (?) Sarah Palin, que esteve na chapa de John McCain em 2008. Entretanto, nenhum destes vices tinha uma abordagem tão efusiva quanto a de Ryan. Será que era esta a injeção de ânimo que faltava à campanha de Mitt Romney? Para William Kristol, editor da Weekly Standard, sim. Tanto que há poucas semanas (antes do anúncio oficial) ele escreveu um artigo intitulado "Vá para o ouro, Mitt" onde falava sobre Ryan e Rubio mas defendia claramente a escolha do primeiro.

Apesar da boa escolha, ainda há um problema com o qual nem Romney nem Ryan parecem saber lidar: política externa. Durante anos no congresso Ryan raramente se mencionou sobre o assunto, evitando até mesmo o posicionamento sobre as guerras. Romney, por outro lado, cometeu algumas gafes recentemente e parece que seguirá cometendo.

Portanto, agora é esperar e ver como se desenrola esta campanha até as eleições presidenciais. A certeza que temos é que os debates serão cada vez mais quentes e o comandante-em-chefe Obama vai precisar mostrar toda a sua experiência política para se reeleger. 

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

O grupamento armado sírio mais organizado está nas mãos de um líbio

Mahdi Al-Harati. Facebook.

Não, o título não está errado. Realmente é um líbio quem comanda o grupo denominado Liwa Al-Ummah (A Bandeira da Nação). Depois de enfatizar tanto a desorganização do Exército Sírio Livre e até mesmo as influências da organização terrorista Al-Qaeda, é muito importante mencionar que existe este bastião revolucionário organizado e sem quaisquer aspirações fanáticas (Sharía).

Quem nos trouxe esta história à tona foi a maravilhosa jornalista Mary Fitzgerald, em artigo publicado no Foreign Policy, onde inclusive entrevistou Mahdi Al-Harati, líbio com passaporte irlandês, que está à frente do grupo. Tal relato serve para desmistificar ao menos um pouco a oposição síria (principalmente por parte dos meios de comunicação orientais, que não fazem uma boa propaganda).

Mas o que teria motivado Al-Harati a lutar na Síria? Antes de responder a este questionamento falaremos sobre a questão de sua terra-natal, a Líbia. Não restam dúvidas de que o autoritarismo do coronel Muamar Kadafi culminou na sua decisão de pegar em armas. Mesmo antes de a revolução "estourar" ele já estava na Líbia. Antes disso vivia com sua esposa na Irlanda e lecionava árabe.

Ao verem seu sucesso e, sobretudo, a sua visão política libertadora não-baseada no fundamentalismo islâmico, influentes opositores sírios ofereceram condições para que ele pudesse formar um grupo armado. Em nenhum momento ele é considerado um mercenário, haja vista que o financiamento vai todo para o Liwa Al-Ummah. Os combatentes possuem não só armas, como também uniformes e inclusive um registro com foto e documentação que é feito por parentes do xeque Al-Harati na Irlanda.

O próprio chefe do grupo diz que há líbios -de sua confiança- no grupo, mas faz questão de relatar que 90% dos já 6 mil combatentes são sírios cansados da ditadura de Assad e também do caos da oposição.

"Havia uma sensação de crescente frustração entre a Síria e os thuwar (revolucionários) sobre sua falta de coordenação. Eles me perguntaram se eu poderia ajudá-los a treinar e se organizar, e eu concordei", afirmou Harati.

Ele também se refere a importância do treinamento para seus soldados, muitos dos quais nunca pegaram em armas: "Estamos aqui para treinar e ajudar os rebeldes da Síria -muitos são médicos, engenheiros e professores- usando a nossa experiência da revolução na Líbia".

A organização é tamanha que, segundo Mary Fitzgerald, aos combatentes também são passadas táticas de guerra. Cá entre nós, isso dificilmente acontece no ESL, até porque quase não há treinamento para eles. Muitos simplesmente passam para o lado dos rebeldes, precisam comprar uma Kalashnikov e atirar. E isso contra um exército preparado é quase uma sentença de morte.

O Liwa Al-Ummah tem até uma página no facebook, onde divulga seus ideais e até mesmo fotos dos combatentes. Há poucos dias, eles exibiram um vídeo no qual muitos rebeldes aderiam ao movimento. Parece que esta atitude tem crescido nos últimos meses. Para um grupo que foi criado neste ano, os números são muitos positivos.

Para aqueles que temem um radicalismo após a iminente queda de Bashar Al-Assad, Harati se posicionou a favor de uma democracia para todas as etnias presentes no país, incluindo os alauítas. O xeque também quer fazer parte do conselho de transição que deverá se formar como ocorreu na Líbia.

Outro objetivo do Liwa Al-Ummah é constituir, futuramente, um partido político na Síria. Todas estas ideias e ações soam como um alívio, já que o desespero nas declarações de pessoas que viram na Al-Qaeda sua única forma de lutar era cada vez mais comum. 

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

O regime de Assad está morrendo aos poucos

ESL em Aleppo. Foto de Ricardo Garcia Vilanova.

Não restam dúvidas de que mais dia menos dia o presidente sírio Bashar Al-Assad irá cair. Mas isso não acontecerá sem que ele lute até as últimas consequências. O que está acontecendo gradativamente, para seu desespero, é o número de baixas de militantes que estavam a seu lado. Segundo o El País, foram 40 deserções de pessoas que formavam o alto escalão do governo.

A mais recente delas foi nesta segunda-feira (06), quando o premiê Riad Farib Hijab anunciou que estava deixando o regime que chamou de "terrorista e assassino". Para piorar a situação, ele mostrou seu total apoio ao Exército Sírio Livre e disse que, em junho, quando foi nomeado primeiro ministro, aceitou o cargo unicamente porque Bashar Al-Assad o ameaçou de morte.

No entanto, este ainda não foi o golpe mais duro que a cúpula de Assad sofreu. Seguramente o atentado terrorista que matou, entre outros, o seu cunhado Bushra Asef Shawkat (um de seus homens de confiança e outro sanguinário) foi muito pior. Como mencionado aqui no Internationale Actuelle, tal atentado mostrou a fragilidade na segurança do presidente. Depois disso muitos chegaram a cogitar sua fuga para Latakia -local de origem dos alauítas- mas a agência estatal Sana desmentiu a informação.

Além disso, outro nome muito próximo de Assad que abandonou o regime foi o general  sunita Manaf Tlass. Ele era filho de Mustapha Tlass, que foi ministro da defesa e amigo de Hafez Al-Assad (pai de Bashar). Manaf era um general extremamente influente e sua saída foi um golpe para o presidente alauíta.

Reparem que até o momento os militares de baixas patentes nem sequer foram listados. Não há um número exato de deserções, mas centenas delas já aconteceram nestes 17 meses de intensos protestos e conflitos no país. O próprio Hijab levantou uma questão interessante: muitos -sejam políticos ou militares-  não se juntam aos opositores por medo. Mesmo o influente Tlass teve certo trabalho até conseguir se exilar e, antes disso, estava em prisão domiciliar.

Todos estes fatos indicam que pouco a pouco toda a cúpula que estava em volta do presidente está caindo. Ele está ficando cada vez mais acuado -tendo apenas o apoio efetivo do Hezbollah e do Irã- e ninguém sabe o que pode fazer em tais condições.

Por outro lado, podemos fazer uma leitura da oposição também: sua desorganização os impede de tomar o poder e instaurar uma democracia (se este for realmente seu desejo). Basicamente o ESL está muito fragmentado e mesmo que agora tenha armas (fornecidas por regimes como os da Arábia Saudita, Qatar e provavelmente Turquia) não tem condições de se firmar.

As duras batalhas que ocorrem simultaneamente em Aleppo (principal cidade econômica da Síria) e na capital Damasco deixa claro o caráter imprevisível do conflito. Há poucos dias os rebeldes foram expulsos de Damasco mas já voltaram a atacar a cidade inesperadamente. Em Aleppo não se sabe quem está vencendo. O único rumor mais forte é o de que o exército de Assad está preparando uma ofensiva para contra-atacar.

A pergunta que fica é a seguinte: quanto tempo mais Bashar Al-Assad vai resistir? Isso é impossível dizer. Inúmeras reviravoltas já aconteceram nesta Guerra Civil e provavelmente ainda acontecerão. Todo este despreparo rebelde pode indicar uma triste prorrogação no conflito.