segunda-feira, 28 de maio de 2012

Entre a Sharia e uma ditadura camuflada

Participação nas urnas foi 46,4% menor do que o esperado.

Na semana passada foram realizadas eleições no Egito a fim de escolher, democraticamente, o primeiro presidente desde a era Hosni Mubarak. Dentre os 13 candidatos haviam populistas, nasseristas, salafistas, moderados, "duas caras" e, pasmem, até mesmo ex-membros do governo Mubarak. Pois bem, já foram divulgados os resultados do primeiro turno e o doutor Mohamed Morsi (24,3%) irá concorrer com Ahmed Shafiq (23,3%) no segundo turno.

Este resultado assustou toda a comunidade internacional e até mesmo os revoltosos da praça Tahrir. Para quem não sabe, Mohamed Morsi é o candidato do radical partido da Irmandade Muçulmana, que foi praticamente execrado do país por Mubarak e agora voltou com tudo. Conseguiu, inclusive, maioria absoluta no Parlamento. Do outro lado está um forte militar (sim, mais um!). Shafiq foi o último primeiro-ministro de Mubarak e sabe-se lá como conseguiu se candidatar às eleições presidenciais, já que os parlamentares inclusive vetaram a sua candidatura.

Do ponto de vista externo as duas opções parecem um tanto absurdas. E realmente são. Mas devemos pensar um pouco na grande maioria do povo egípcio. Maioria esta que viu o caos se instalar no país após a queda do antigo ditador. A verdade é que os egípcios não estavam preparados para esta transição democrática e a grave crise econômica (e mesmo social) que se instaurou na nação fez a população ficar literalmente acuada, sem saber o que fazer.

Durante o governo de Mubarak realmente não havia oposição, já que ele -no melhor estilo Bashar Al Assad- coibia toda e qualquer revolta. Logo após sua queda declarações de etnias que mal se conheciam, ainda que habitassem o mesmo país, correram o mundo. Era como se Mubarak inventasse ameaças entre os grupos e colocasse o exército nas ruas para manter a ordem. Ele mentiu e exagerou, mas deu certo. Por favor, não estou aqui para defender esta bizarra ditadura. Longe disso, estou apenas reproduzindo muitos depoimentos de egípcios que li em vários jornais.

Com as eleições parlamentares pudemos ter consciência da força da Irmandade Muçulmana dentro do Egito, visto que o partido islamista ocupou a grande maioria das cadeiras do Parlamento. O problema é que, poucos meses após sua eleição, eles já desagradaram até mesmo parte de seu eleitorado, respaldando atitudes violentas dos exército contra manifestantes. Ademais, a ideia da Sharia (lei islâmica) assusta não só os 10% de cristãos coptas como também os setores mais liberais da sociedade.

Tendo em vista esta "ameaça radical" qual foi o primeiro reflexo do povo? Não votar em Mohamed Morsi. Mas por que a escolha de Shafiq? O que explica a opção feita pelo ex-primeiro-ministro de Mubarak é o tema estabilidade. O fato é que muita gente aderiu à revolução sem saber direito o que ela significava, por isso se assustou com a situação caótica que se instaurou mesmo com os militares no poder. "Ele vai colocar o exército nas ruas e restaurar a ordem", dizia um eleitor sobre Shafiq.

Logicamente os revoltosos da praça Tahrir não deixaram isso barato e já foram às ruas protestar contra os resultados das eleições. Muitos ameaçaram até mesmo absterem-se no segundo turno e contestaram a veracidade dos resultados. Hamdin Sabbahi, candidato nasserista e terceiro mais votado (20%), tentou recorrer à justiça eleitoral egípcia, mas não teve jeito.

Agora é esperar o que parte do povo vai decidir nos dias 16 e 17 junho para sabermos quem presidirá o Egito. Se for o doutor Morsi, a Irmandade Muçulmana terá total controle do país. Se for Shafiq, ele precisará ser um pouco mais comedido justamente por causa das pressões externas e do Parlamento, mas ele tem o apoio do exército. Em suma, a complexa situação na política egípcia está longe de se estabilizar.


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